O professor de História como curador/mediador – Resenha do Livro “Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história”, de Renato Fontes de Souza

Resenhado por Daniel Da Silva Costa (SEC-BA/UFS) | ID: https://orcid.org/0000-0002-6706-5648.


Banner da conta de Renato Souza no Linkdin. Catalan Map of Europe and North Africa, presented to Charles V of France in 1381, de Abraham Cresques | Imagem: Meisterdrucker. No detalhe, Renato Fontes de Souza | Imagem: Linkedin

O livro Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história foi escrito por Renato Fontes de Souza e publicado no ano de 2021, pela Editora Dialética. Como o próprio título sugere, o livro discute o uso de objetos digitais de aprendizagem, entendidos como recursos digitais que podem servir de ferramentas didáticas e apoiar a prática pedagógica de professores e alunos dentro e fora da sala de aula tradicional, a exemplo de animações, vídeos e jogos. No livro, o autor questiona: quais critérios os professores de História podem empregar para selecionar objetos de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio? Seu objetivo, contudo, não é indicar objetos digitais, mas sim, apontar os parâmetros que os professores de História podem usar para selecionar objetos digitais de aprendizagem que subsidiem o ensino/aprendizagem de História do Brasil no Ensino Médio, ajudando na construção de uma prática docente significativa para o aluno.

Renato Fontes de Souza é mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e docente de História na educação básica há mais de 15 anos. A obra é o resultado de pesquisa de Mestrado no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e está disponibilizada tanto na versão impressa quanto na digital. Nesse formato, organiza-se em quatro capítulos, subdivididos em vários tópicos e subtópicos (além da introdução e apresentação do problema, objeto e objetivos da pesquisa).

Na introdução, o autor se limita a apontar os fatores que o levaram a trabalhar com o tema, comentando sobre sua trajetória no ensino de História na educação básica e as problemáticas observadas ao longo dos seus tempo de docência da disciplina. No tópico seguinte – “Problema, Objeto e Objetivo” –, o autor discute o maciço uso das tecnologias de informação. De início, começa a definir, por meio de revisão de literatura, os desafios que permeiam o ensino de história na atualidade, bem como problemáticas que impedem ou dificultam a introdução de recursos digitais nas aulas de História. Na sequência, dedica um tópico para apresentação do problema. O questionamento tem origem na constatação de que, não obstante o fato de as tecnologias digitais ocuparem espaço de ressignificador de posição na sociedade e dos documentos que tratam da educação brasileira darem importância central à incorporação das tecnologias para o processo de ensino/aprendizagem, muito pouco é feito diante da enorme possibilidade de ações pedagógicas com o uso das tecnologias digitais de informação e conhecimento. Para o autor, tal fato decorre principalmente do pouco espaço que a temática ocupa tanto na formação inicial quanto continuada de professores. Em seguida, no tópico “Objeto e Objetivos da pesquisa”, o autor apresenta a questão-problema que motivou a pesquisa: quais critérios os professores de História podem empregar para selecionar objetos de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio? A partir dessa questão, o autor expõe os objetivos geral e específicos do trabalho. Além dessa exposição do problema e dos objetivos, nesse tópico, o autor faz ainda um breve resumo de cada um dos quatro capítulos.

No primeiro capítulo – “Referencial Teórico” –, por meio de revisão de literatura, o autor define Objetos Digitais de Aprendizagem (ODA) bem como os principais elementos presentes em tais recursos que, juntos, ajudam no processo de ensino/aprendizagem. Ele defende os ODAs como importante arma na democratização do ensino e do conhecimento. Logo na sequência, o autor vai abordar a importância da formação docente (tanto continuada quanto inicial) voltada ao uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TDIC), afirmando que essa formação ainda é praticamente ignorada nos cursos de formação de professores. Nesse ponto, o autor defende que a formação do professor deve ter como objetivo não só a alfabetização digital do docente. A formação prepara o professor para o domínio técnico dos recursos, mas deve objetivar, principalmente, o domínio crítico da linguagem tecnológica, capacitando-o em curador dos recursos a serem utilizados.

Ainda no primeiro capítulo, o autor discute as formas pelas quais as políticas públicas e os documentos orientadores do currículo nacional, como a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) têm abordado a inserção dos conteúdos digitais nos materiais didáticos e nos currículos da educação básica. Nesse sentido, o autor demonstra que a inclusão de objetos digitais já se constitui uma das preocupações basilares dos documentos orientadores do currículo nacional, a exemplo da BNCC, que em seu artigo 7º, estabelece que os currículos das escolas devem “selecionar, produzir, aplicar e avaliar recursos didáticos e tecnológicos para apoiar o processo de ensinar e aprender”. Nesse mesmo sentido, o autor demonstra que os editais do PNLD, desde 2014, têm feito a inserção de objetos digitais. Para ele, essa presença dos objetos digitais de aprendizagem nos materiais de História, produzidos pelo PNLD, tem impulsionado a produção de variadas ferramentas de ensino e de aprendizagem por meio de Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação (TDIC). Não obstante esse fato, o autor tece forte crítica à maneira incipiente pela qual os recursos digitais são usados na prática, bem como a falta de incentivo à mudança na formação do professor, por parte do poder público, e ao uso do recurso, por parte do professor, com a manutenção da perspectiva tradicional da história narrativa.

No segundo capítulo (o mais breve da obra) – “Método e Procedimento de Pesquisa –, o autor trata do método de pesquisa adotado, apontando os procedimentos empregados na pesquisa documental, na formulação dos critérios que integraram o roteiro avaliativo desenvolvido e apresentado no terceiro capítulo. Com tal fito, apresenta o roteiro para a coleta dos dados de pesquisa, baseada na metodologia da pesquisa qualitativa, adotando como orientação filosófica o pensamento crítico-dialético que, de acordo com o autor, tem como objetivo: “revelar as contradições e os dinamismos que envolvem os sujeitos históricos na organização social e política” (p.76). Assim, para realização da pesquisa e confecção do roteiro avaliativo, o autor consultou dois repositórios (Rede Internacional Virtual de Educação e o Banco Internacional de Objetos Educacionais ambos disponíveis no Portal do professor) de onde selecionou os exemplos de objetos digitais de aprendizagem assim intitulados: “Era Vargas” e “Princesa Isabel e o 13 de maio – desconstruindo a interpretação oficial da abolição da escravidão”.

O terceiro capítulo é o mais importante da obra, haja vista que é nele que se cumpre o objetivo da pesquisa, isto é: a apresentação de roteiro avaliativo para a curadoria/escolha de objetos de aprendizagem de História do Brasil. Para este fim, o autor declara que, na seleção dos ODA, é fundamental observar: aspectos conceituais (a abordagem de ensino e os conceitos históricos adotados pelo ODA); aspectos pedagógicos (se ODA prima pela análise crítica das fontes, se privilegia uma aprendizagem significativa, além de disponibilizar ferramentas para professores e alunos); aspectos Técnicos (indexação ou capacidade de os ODA serem reutilizados em diferentes contextos por meio do uso de banco de dados); recuperabilidade, característica que permite a disponibilidade das informações em arquivos digitais, podendo estar separados ou combinados em segmentos, como coletâneas e pastas; acessibilidade, que permite observar a marca democratizante e inclusiva do ODA, pois garante o acesso a pessoas com restrições físicas (recursos como audiodescrições, variação de tamanho da cor e contrastes das fontes e suporte técnico); interoperabilidade ou capacidade de operar em diferentes meios. Facilitando essa tarefa por parte dos professores, o autor disponibiliza um roteiro composto por quatro tabelas com os critérios a serem observados em cada um desses aspectos. Para demonstrar a aplicação desse roteiro, o autor usa imagens ilustrativas com prints das diversas páginas dos mencionados repositórios digitais. Além disso, faz uma abordagem histórica do ensino de História, sintetizando a trajetória do Brasil Colônia até os dias de hoje, oportunidade em que faz uma análise da legislação educacional atual, buscando entender como tem se dado a relação entre a cultura digital aplicada à sala de aula e as diretrizes e políticas públicas de educação no Brasil, tal qual o PNLD, o Plano Nacional de Educação (PNE) e a BNCC.

No quarto capítulo, o autor apresenta as conclusões da pesquisa e aponta questões que podem ser abordadas em um futuro trabalho, dando destaque para a seguinte problemática: no tocante à formação inicial de professores, quais são os desafios para formarmos professores como curadores digitais?

Como conclusão principal, vale destacar a sua afirmação de que os recursos digitais são grandes aliados na promoção e multiplicação do conhecimento, na medida em que favorecem o contato entre saberes, ideias, acontecimentos e pessoas para além das barreiras físicas e temporais, permitindo a comunicação em múltiplas linguagens e incentivando troca de conhecimento que conduzem a uma aprendizagem significativa; na mesma esteira, favorecem a democratização do ensino.

Impressão digital do mundo. Ilustração do vetor: DreamsTime

Além disso o autor declara que a tecnologia por si só não é capaz de transformar a educação ou contribuir para um ensino significativo, haja vista que do mesmo modo que elas ajudam, em alguns momentos e contextos, podem se transformar em obstáculos; sendo assim, o autor aponta para o papel protagonista do professor, que deve assumir uma posição de curador, escolhendo e utilizando recursos digitais de maneira crítica e que favoreça a autonomia do aluno.

Dessas conclusões, teço uma consideração avaliativa. Acredito que faltam exemplos práticos quando da definição, por exemplo, de “Objetos Digitais de Aprendizagem e suas características (Reusabilidade, granularidade, interoperabilidade e recuperabilidade). algo que deixaria o trabalho mais rico, uma vez que facilitaria o entendimento por parte dos leitores que pouco ou nada conhecem sobre a temática da obra.

O livro, contudo, é uma leitura de suma importância não só por professores/pesquisadores de História que estudam a temática do uso dos recursos digitais no ensino de História, pois não se limita a tratar dos recursos digitais, defendendo importantes posições políticas e pedagógicas, ao longo da obra. Destaco, por exemplo, a explicitação dos limites tecnologia na transformação das práticas educativas e na solução dos seus problemas, havendo situações nas quais ela pode até se constituir em um obstáculo ao fazer pedagógico. Assim, o autor defende que devemos entender os recursos digitais como uma ferramenta que precisa do olhar crítico do professor, colocando o docente em uma posição de destaque não do ponto de vista tradicional daquele que transmite informações, mas sim numa posição de mediador entre as informações e o aluno, trabalhando como um curador que atua na seleção, crítica, validação e disponibilização dos objetos digitais de aprendizagem. Essa posição é importante porque rompe com a ideia de que basta introduzir recursos digitais para fazer uma educação significativa.

Outro ponto destacável da postura adotada pelo autor é sua defesa incisiva do rompimento da perspectiva da História baseada em narrativa, defendendo assim que devemos nos apropriar dos recursos digitais que favoreçam um ensino baseado em uma História problema, estimulando a participação ativa do aluno e permitindo que este se reconheça nos temas trabalhados na disciplina. Nesse sentido, o autor não apenas cobra, mas aponta como fazer isso, fornecendo, em seu roteiro de avaliação presente no terceiro capítulo, os critérios que, se forem observados no processo de seleção dos recursos digitais, podem levar a este ensino baseado em uma História que rompa com a perspectiva meramente narrativa.

Assim, a obra cumpre com muito êxito o prometido nos objetivos, apresentando o roteiro de avaliação de objetos digitais de aprendizagem, constituindo-se em um verdadeiro manual de como selecionar e utilizar recursos digitais e tecnológicos levando-se em consideração não apenas o formato ou a questão estética, mas sim, os aspectos pedagógicos, conceituais e técnicos. A obra estimula o professor a selecionar objetos digitais por meio de um método portador de intencionalidades (democratizar informações, favorecer o protagonismo do aluno e desenvolver um ensino de História amparado na crítica), empregando os objetos digitais como uma ferramenta de aprendizagem significativa e socialmente transformadora. Nesse mesmo sentido, a obra se destaca ainda pela maneira como expôs o roteiro avaliativo, no terceiro capítulo, empregando muitas imagens (além de uma tabela intuitiva), demostrando o passo a passo para seleção de um ODA de História, desde a página inicial do repositório, aos mecanismos de filtro até chegar ao tema desejado. Esses recursos orientam, na prática, como observar os aspectos conceituais, pedagógicos e técnicos que o autor havia definido anteriormente. Por fim, é importante destacar, também, a maneira clara e didática pela qual o autor conseguiu definir conceitos que não são tão comuns ao vocabulário de professores de História, como por exemplo o conceito de Objetos Virtuais de Aprendizagem, granularidade, metadados e interoperabilidade.

 

Sumário de Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história

  • Introdução
  • Problema, objeto e objetivo
    • 1. Referencial teórico
    • 1.1. Objetos Digitais de Aprendizagem
    • 1.2. Avaliação dos Objetos de Aprendizagem
    • 1.3. Objetos de Aprendizagem de História: recursos tecnológicos e possibilidades pedagógicas
    • 1.4. O papel do PNLD na oferta de Objetos Digitais na Educação Básica
    • 1.5. Recursos Educacionais Abertos
    • 1.6. Formação docente e TDIC
    • 1.7. Ensino, Tecnologia e Curadoria
  • 2. Método e procedimento de pesquisa
    • 2.1. Roteiro de investigação
    • 3. Coleta e análise dos dados
    • 3.1. Ensino de História na contemporaneidade
    • 3.2. Roteiro para a análise dos objetos digitais de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio
    • 3.3. Proposta de roteiro avaliativo
    • 3.4. Aplicação do roteiro avaliativo para ODA de História do Brasil
  • Conclusões
  • Sobre as características dos repositórios analisados
  • Sobre as características pedagógicas dos ODA analisados
  • Referências

Resenhista

Daniel da Silva Costa é professor de História na Escola Estadual Maria Leide de Oliveira e no Colégio Estadual José Lourenço de Carvalho, ambos localizados no município de Jeremoabo-BA. É mestrando em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Entre outros trabalhos, publicou “Os Antecedentes Do Conflito De Canudos: a imprensa, as elites agrárias e a construção do medo.” https://docplayer.com.br/54231661-Os-antecedentes-do-conflito-de-canudos-a-imprensa-as-elites-agrarias-e-a-construcao-do-medo.html. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7966130351513150; Orcid: https://orcid.org/0000-0002-6706-5648; Instagram: danielcosta.96; E-mail: [email protected]


Para citar esta resenha

SOUZA, Renato Fontes de. Objetos digitais de aprendizagem. Belo Horizonte: Dialética, 2021. 165p. Resenha de: COSTA, Daniel da Silva. O professor de História como curador/mediador. Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n.7, set./out., 2022. Disponível em<https://www.criticahistoriografica.com.br/o-professor-de-historia-como-curador-mediador-resenha-do-livro-objetos-digitais-de-aprendizagem-uma-nova-abordagem-para-o-ensino-de-historia-de-renato-fontes-de-souza/>


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA).

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n. 7, set./out, 2022 | ISSN 2764-2666

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O professor de História como curador/mediador – Resenha do Livro “Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história”, de Renato Fontes de Souza

Resenhado por Daniel Da Silva Costa (SEC-BA/UFS) | ID: https://orcid.org/0000-0002-6706-5648.


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O livro Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história foi escrito por Renato Fontes de Souza e publicado no ano de 2021, pela Editora Dialética. Como o próprio título sugere, o livro discute o uso de objetos digitais de aprendizagem, entendidos como recursos digitais que podem servir de ferramentas didáticas e apoiar a prática pedagógica de professores e alunos dentro e fora da sala de aula tradicional, a exemplo de animações, vídeos e jogos. No livro, o autor questiona: quais critérios os professores de História podem empregar para selecionar objetos de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio? Seu objetivo, contudo, não é indicar objetos digitais, mas sim, apontar os parâmetros que os professores de História podem usar para selecionar objetos digitais de aprendizagem que subsidiem o ensino/aprendizagem de História do Brasil no Ensino Médio, ajudando na construção de uma prática docente significativa para o aluno.

Renato Fontes de Souza é mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e docente de História na educação básica há mais de 15 anos. A obra é o resultado de pesquisa de Mestrado no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e está disponibilizada tanto na versão impressa quanto na digital. Nesse formato, organiza-se em quatro capítulos, subdivididos em vários tópicos e subtópicos (além da introdução e apresentação do problema, objeto e objetivos da pesquisa).

Na introdução, o autor se limita a apontar os fatores que o levaram a trabalhar com o tema, comentando sobre sua trajetória no ensino de História na educação básica e as problemáticas observadas ao longo dos seus tempo de docência da disciplina. No tópico seguinte – “Problema, Objeto e Objetivo” –, o autor discute o maciço uso das tecnologias de informação. De início, começa a definir, por meio de revisão de literatura, os desafios que permeiam o ensino de história na atualidade, bem como problemáticas que impedem ou dificultam a introdução de recursos digitais nas aulas de História. Na sequência, dedica um tópico para apresentação do problema. O questionamento tem origem na constatação de que, não obstante o fato de as tecnologias digitais ocuparem espaço de ressignificador de posição na sociedade e dos documentos que tratam da educação brasileira darem importância central à incorporação das tecnologias para o processo de ensino/aprendizagem, muito pouco é feito diante da enorme possibilidade de ações pedagógicas com o uso das tecnologias digitais de informação e conhecimento. Para o autor, tal fato decorre principalmente do pouco espaço que a temática ocupa tanto na formação inicial quanto continuada de professores. Em seguida, no tópico “Objeto e Objetivos da pesquisa”, o autor apresenta a questão-problema que motivou a pesquisa: quais critérios os professores de História podem empregar para selecionar objetos de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio? A partir dessa questão, o autor expõe os objetivos geral e específicos do trabalho. Além dessa exposição do problema e dos objetivos, nesse tópico, o autor faz ainda um breve resumo de cada um dos quatro capítulos.

No primeiro capítulo – “Referencial Teórico” –, por meio de revisão de literatura, o autor define Objetos Digitais de Aprendizagem (ODA) bem como os principais elementos presentes em tais recursos que, juntos, ajudam no processo de ensino/aprendizagem. Ele defende os ODAs como importante arma na democratização do ensino e do conhecimento. Logo na sequência, o autor vai abordar a importância da formação docente (tanto continuada quanto inicial) voltada ao uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TDIC), afirmando que essa formação ainda é praticamente ignorada nos cursos de formação de professores. Nesse ponto, o autor defende que a formação do professor deve ter como objetivo não só a alfabetização digital do docente. A formação prepara o professor para o domínio técnico dos recursos, mas deve objetivar, principalmente, o domínio crítico da linguagem tecnológica, capacitando-o em curador dos recursos a serem utilizados.

Ainda no primeiro capítulo, o autor discute as formas pelas quais as políticas públicas e os documentos orientadores do currículo nacional, como a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) têm abordado a inserção dos conteúdos digitais nos materiais didáticos e nos currículos da educação básica. Nesse sentido, o autor demonstra que a inclusão de objetos digitais já se constitui uma das preocupações basilares dos documentos orientadores do currículo nacional, a exemplo da BNCC, que em seu artigo 7º, estabelece que os currículos das escolas devem “selecionar, produzir, aplicar e avaliar recursos didáticos e tecnológicos para apoiar o processo de ensinar e aprender”. Nesse mesmo sentido, o autor demonstra que os editais do PNLD, desde 2014, têm feito a inserção de objetos digitais. Para ele, essa presença dos objetos digitais de aprendizagem nos materiais de História, produzidos pelo PNLD, tem impulsionado a produção de variadas ferramentas de ensino e de aprendizagem por meio de Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação (TDIC). Não obstante esse fato, o autor tece forte crítica à maneira incipiente pela qual os recursos digitais são usados na prática, bem como a falta de incentivo à mudança na formação do professor, por parte do poder público, e ao uso do recurso, por parte do professor, com a manutenção da perspectiva tradicional da história narrativa.

No segundo capítulo (o mais breve da obra) – “Método e Procedimento de Pesquisa –, o autor trata do método de pesquisa adotado, apontando os procedimentos empregados na pesquisa documental, na formulação dos critérios que integraram o roteiro avaliativo desenvolvido e apresentado no terceiro capítulo. Com tal fito, apresenta o roteiro para a coleta dos dados de pesquisa, baseada na metodologia da pesquisa qualitativa, adotando como orientação filosófica o pensamento crítico-dialético que, de acordo com o autor, tem como objetivo: “revelar as contradições e os dinamismos que envolvem os sujeitos históricos na organização social e política” (p.76). Assim, para realização da pesquisa e confecção do roteiro avaliativo, o autor consultou dois repositórios (Rede Internacional Virtual de Educação e o Banco Internacional de Objetos Educacionais ambos disponíveis no Portal do professor) de onde selecionou os exemplos de objetos digitais de aprendizagem assim intitulados: “Era Vargas” e “Princesa Isabel e o 13 de maio – desconstruindo a interpretação oficial da abolição da escravidão”.

O terceiro capítulo é o mais importante da obra, haja vista que é nele que se cumpre o objetivo da pesquisa, isto é: a apresentação de roteiro avaliativo para a curadoria/escolha de objetos de aprendizagem de História do Brasil. Para este fim, o autor declara que, na seleção dos ODA, é fundamental observar: aspectos conceituais (a abordagem de ensino e os conceitos históricos adotados pelo ODA); aspectos pedagógicos (se ODA prima pela análise crítica das fontes, se privilegia uma aprendizagem significativa, além de disponibilizar ferramentas para professores e alunos); aspectos Técnicos (indexação ou capacidade de os ODA serem reutilizados em diferentes contextos por meio do uso de banco de dados); recuperabilidade, característica que permite a disponibilidade das informações em arquivos digitais, podendo estar separados ou combinados em segmentos, como coletâneas e pastas; acessibilidade, que permite observar a marca democratizante e inclusiva do ODA, pois garante o acesso a pessoas com restrições físicas (recursos como audiodescrições, variação de tamanho da cor e contrastes das fontes e suporte técnico); interoperabilidade ou capacidade de operar em diferentes meios. Facilitando essa tarefa por parte dos professores, o autor disponibiliza um roteiro composto por quatro tabelas com os critérios a serem observados em cada um desses aspectos. Para demonstrar a aplicação desse roteiro, o autor usa imagens ilustrativas com prints das diversas páginas dos mencionados repositórios digitais. Além disso, faz uma abordagem histórica do ensino de História, sintetizando a trajetória do Brasil Colônia até os dias de hoje, oportunidade em que faz uma análise da legislação educacional atual, buscando entender como tem se dado a relação entre a cultura digital aplicada à sala de aula e as diretrizes e políticas públicas de educação no Brasil, tal qual o PNLD, o Plano Nacional de Educação (PNE) e a BNCC.

No quarto capítulo, o autor apresenta as conclusões da pesquisa e aponta questões que podem ser abordadas em um futuro trabalho, dando destaque para a seguinte problemática: no tocante à formação inicial de professores, quais são os desafios para formarmos professores como curadores digitais?

Como conclusão principal, vale destacar a sua afirmação de que os recursos digitais são grandes aliados na promoção e multiplicação do conhecimento, na medida em que favorecem o contato entre saberes, ideias, acontecimentos e pessoas para além das barreiras físicas e temporais, permitindo a comunicação em múltiplas linguagens e incentivando troca de conhecimento que conduzem a uma aprendizagem significativa; na mesma esteira, favorecem a democratização do ensino.

Impressão digital do mundo. Ilustração do vetor: DreamsTime

Além disso o autor declara que a tecnologia por si só não é capaz de transformar a educação ou contribuir para um ensino significativo, haja vista que do mesmo modo que elas ajudam, em alguns momentos e contextos, podem se transformar em obstáculos; sendo assim, o autor aponta para o papel protagonista do professor, que deve assumir uma posição de curador, escolhendo e utilizando recursos digitais de maneira crítica e que favoreça a autonomia do aluno.

Dessas conclusões, teço uma consideração avaliativa. Acredito que faltam exemplos práticos quando da definição, por exemplo, de “Objetos Digitais de Aprendizagem e suas características (Reusabilidade, granularidade, interoperabilidade e recuperabilidade). algo que deixaria o trabalho mais rico, uma vez que facilitaria o entendimento por parte dos leitores que pouco ou nada conhecem sobre a temática da obra.

O livro, contudo, é uma leitura de suma importância não só por professores/pesquisadores de História que estudam a temática do uso dos recursos digitais no ensino de História, pois não se limita a tratar dos recursos digitais, defendendo importantes posições políticas e pedagógicas, ao longo da obra. Destaco, por exemplo, a explicitação dos limites tecnologia na transformação das práticas educativas e na solução dos seus problemas, havendo situações nas quais ela pode até se constituir em um obstáculo ao fazer pedagógico. Assim, o autor defende que devemos entender os recursos digitais como uma ferramenta que precisa do olhar crítico do professor, colocando o docente em uma posição de destaque não do ponto de vista tradicional daquele que transmite informações, mas sim numa posição de mediador entre as informações e o aluno, trabalhando como um curador que atua na seleção, crítica, validação e disponibilização dos objetos digitais de aprendizagem. Essa posição é importante porque rompe com a ideia de que basta introduzir recursos digitais para fazer uma educação significativa.

Outro ponto destacável da postura adotada pelo autor é sua defesa incisiva do rompimento da perspectiva da História baseada em narrativa, defendendo assim que devemos nos apropriar dos recursos digitais que favoreçam um ensino baseado em uma História problema, estimulando a participação ativa do aluno e permitindo que este se reconheça nos temas trabalhados na disciplina. Nesse sentido, o autor não apenas cobra, mas aponta como fazer isso, fornecendo, em seu roteiro de avaliação presente no terceiro capítulo, os critérios que, se forem observados no processo de seleção dos recursos digitais, podem levar a este ensino baseado em uma História que rompa com a perspectiva meramente narrativa.

Assim, a obra cumpre com muito êxito o prometido nos objetivos, apresentando o roteiro de avaliação de objetos digitais de aprendizagem, constituindo-se em um verdadeiro manual de como selecionar e utilizar recursos digitais e tecnológicos levando-se em consideração não apenas o formato ou a questão estética, mas sim, os aspectos pedagógicos, conceituais e técnicos. A obra estimula o professor a selecionar objetos digitais por meio de um método portador de intencionalidades (democratizar informações, favorecer o protagonismo do aluno e desenvolver um ensino de História amparado na crítica), empregando os objetos digitais como uma ferramenta de aprendizagem significativa e socialmente transformadora. Nesse mesmo sentido, a obra se destaca ainda pela maneira como expôs o roteiro avaliativo, no terceiro capítulo, empregando muitas imagens (além de uma tabela intuitiva), demostrando o passo a passo para seleção de um ODA de História, desde a página inicial do repositório, aos mecanismos de filtro até chegar ao tema desejado. Esses recursos orientam, na prática, como observar os aspectos conceituais, pedagógicos e técnicos que o autor havia definido anteriormente. Por fim, é importante destacar, também, a maneira clara e didática pela qual o autor conseguiu definir conceitos que não são tão comuns ao vocabulário de professores de História, como por exemplo o conceito de Objetos Virtuais de Aprendizagem, granularidade, metadados e interoperabilidade.

 

Sumário de Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história

  • Introdução
  • Problema, objeto e objetivo
    • 1. Referencial teórico
    • 1.1. Objetos Digitais de Aprendizagem
    • 1.2. Avaliação dos Objetos de Aprendizagem
    • 1.3. Objetos de Aprendizagem de História: recursos tecnológicos e possibilidades pedagógicas
    • 1.4. O papel do PNLD na oferta de Objetos Digitais na Educação Básica
    • 1.5. Recursos Educacionais Abertos
    • 1.6. Formação docente e TDIC
    • 1.7. Ensino, Tecnologia e Curadoria
  • 2. Método e procedimento de pesquisa
    • 2.1. Roteiro de investigação
    • 3. Coleta e análise dos dados
    • 3.1. Ensino de História na contemporaneidade
    • 3.2. Roteiro para a análise dos objetos digitais de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio
    • 3.3. Proposta de roteiro avaliativo
    • 3.4. Aplicação do roteiro avaliativo para ODA de História do Brasil
  • Conclusões
  • Sobre as características dos repositórios analisados
  • Sobre as características pedagógicas dos ODA analisados
  • Referências

Resenhista

Daniel da Silva Costa é professor de História na Escola Estadual Maria Leide de Oliveira e no Colégio Estadual José Lourenço de Carvalho, ambos localizados no município de Jeremoabo-BA. É mestrando em Ensino de História pela Universidade Federal de Sergipe. Entre outros trabalhos, publicou “Os Antecedentes Do Conflito De Canudos: a imprensa, as elites agrárias e a construção do medo.” https://docplayer.com.br/54231661-Os-antecedentes-do-conflito-de-canudos-a-imprensa-as-elites-agrarias-e-a-construcao-do-medo.html. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7966130351513150; Orcid: https://orcid.org/0000-0002-6706-5648; Instagram: danielcosta.96; E-mail: [email protected]


Para citar esta resenha

SOUZA, Renato Fontes de. Objetos digitais de aprendizagem. Belo Horizonte: Dialética, 2021. 165p. Resenha de: COSTA, Daniel da Silva. O professor de História como curador/mediador. Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n.7, set./out., 2022. Disponível em<https://www.criticahistoriografica.com.br/o-professor-de-historia-como-curador-mediador-resenha-do-livro-objetos-digitais-de-aprendizagem-uma-nova-abordagem-para-o-ensino-de-historia-de-renato-fontes-de-souza/>


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA).

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n. 7, set./out, 2022 | ISSN 2764-2666

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