Proposta crítica e multidimensional para um novo feminismo – Resenha de “Um Feminismo Decolonial”, de Françoise Vergès

Resenhado por Viviane Andrade Passos (SEMED-NSG/UFS) | ID: https://orcid.org/0000-0003-4077-3916.


Françoise Vergès (2020) | Imagem: Anthony Francin/Divulgação

Un féminisme décolonial, [Um Feminismo Decolonial], de Françoise Vergés, reivindica uma teoria multidimensional do movimento feminista: antirracista, antipatriarcal, anticolonial e anticapitalista. O livro também tece críticas ao movimento feminista civilizatório. Apresentado inicialmente por Flávia Rios, no texto ‘Por um feminismo radical’, traduzido por Jamille Pinheiro Dias e Raquel Camargo. A obra é construída por um prefácio à edição brasileira, da própria autora, uma introdução – “Invisíveis, elas “abrem a cidade” – e dois capítulos: “Definir um campo: o Feminismo Decolonial” e “A evolução para um feminismo civilizatório do século XXI”. O livro resulta dos estudos da autora sobre o pensamento feminista e a decolonialidade, publicado originariamente na França, em 2019, e lançado em português, no Brasil, pela Ubu Editora, em 2020.

Françoise Vergés é cientista política, historiadora, ativista e especialista em estudos pós-coloniais. Graduou-se em Ciências Políticas e Estudos Feministas na San Diego State University (1989) e tornou-se PhD em Teoria Política pela Berkeley University of California (1995) com a tese “Monsters and Revolutionaries: Colonial Family Romance and Métissage” [Monstros e revolucionários: o romance e a mestiçagem da família colonial] (Duke University Press, 1999). Vergés lecionou na Sussex University e na Goldsmiths College (Inglaterra). De 2009 a 2012, presidiu o comitê nacional francês de preservação da memória e da história da escravidão. Entre 2014 e 2018, foi titular do programa Global South(s) no Collège d’études mondiales da Fondation Maison des Sciences de l’Homme e publicou diversos artigos sobre Frantz Fanon, Aimé Césaire, abolicionismo, psiquiatria colonial e pós-colonial, memória da escravidão, processos de creolização no Oceano Índico e novas formas de colonização e racialização. Trabalha regularmente com artistas, tendo sido coautora dos documentários “Aimé Césaire face aux révoltes du monde” [Aimé Césaire em face das revoltas do mundo] e “Maryse Condé: une voix singulière” [Maryse Condé: uma voz singular] (Jérôme-Cécile Auffret, 2002; Paris Triennale, 2012). Vergé também organizou as exposições “L’Esclave au Louvre: une humanité invisible” [O escravo no Louvre: uma humanidade invisível] (Museu do Louvre, 2013), “Dix femmes puissantes” [Dez mulheres poderosas], (2013), e “Haiti, medo dos opressores, esperança dos oprimidos” (2014), ambas para o Mémorial de l’abolition de l’esclavage, de Nantes. (p.139-140)

Este livro representa um manifesto cientificamente crítico ao definir um conceito capaz de provocar transformações nos estudos sobre gênero e pensamento feminista para além da interseccionalidade. Ele apresenta uma teoria, ainda que aberta a questionamentos, sobre a multidimensionalidade do feminismo decolonial a partir de debates sobre a permanência da estrutura colonial em sociedades do Sul Global que, embora descolonizadas, permanecem arraigadas em estruturas sociais de colonialidade.

A nota introdutória de Flávia Rios – “Por um Feminismo Radical” – destaca a crítica breve e incendiária ao eurocentrismo presente no pensamento feminista e declara que o livro defende um feminismo radical, antipatriarcal, anticolonial e anticapitalista capaz de transformar as estruturas coloniais e reconhece a importância de problematizarmos o feminismo, principalmente, em seu caráter de “feminismo civilizatório.”

Na nota da tradução, Dias e Camargo esclarecem que a conversão de décolonial em francês para decolonial em português significa o enfrentamento da colonialidade do poder que persiste como legado da modernidade do capitalismo e do racismo. Ela difere da expressão descolonial, referente aos processos histórico-administrativos de desligamento das metrópoles às ex-colônias, já que estes não garantem que os discursos que circulam nele superem a lógica colonial.

No prefácio, a autora relata a motivação para a escrita do livro: a invisibilidade de um trabalho marcado pelo gênero, subqualificado e racializado, mas essencial à estrutura e funcionamento do patriarcado e do capitalismo. Ela também o escreveu para dar visibilidade à dimensão colonial e racial do feminismo civilizatório que, ao igualar a mulher ao homem, atribui às mulheres direitos que servem mais aos interesses neoliberais e imperialistas de exploração e opressão. Para a autora, a epidemia de Covid 19 escancarou a vulnerabilidade das mulheres racializadas expostas a várias formas de violência, a trabalhos insalubres, em que  o confinamento foi uma política para os ricos.

Na introdução – ‘Invisíveis, elas “abrem a cidade” –, a autora expõe a árdua e incansável tarefa das mulheres racializadas de limparem o mundo e a necessidade de manter invisível esse trabalho para a manutenção do capitalismo em que mulheres da burguesia gozam de uma vida confortável em detrimento da exploração de milhões de mulheres racializadas do Sul global, o que constitui a principal crítica da obra já que a autora atribui essa organização ao capitalismo racial e ao heteropatriarcado.

O capítulo 1 – “Definir um campo: o feminismo decolonial” – é subdividido em tópicos que apresentam uma definição sobre o feminismo decolonial, a partir da exposição histórica do movimento feminista. Ele critica a ideologia feminista nacionalista, civilizatória e xenófoba, tipificando-o como um arsenal para a direita neoliberal modernizadora. Esse tipo de feminismo defende apenas as questões de gênero e de igualdade de direitos postas a serviço do capital, do Estado e do império e desconsideram a luta por justiça social, dignidade e respeito. Esse “feminismo civilizatório” reduz as aspirações revolucionárias das mulheres à demanda por divisão igualitária dos privilégios concedidos aos homens brancos em razão da supremacia racial branca. Cúmplices ativas da ordem capitalista racial, as feministas civilizatórias não hesitam em apoiar políticas de intervenção imperialistas, políticas islamofóbicas ou negrofóbicas.

A autora convoca o leitor para um movimento de militância anticolonial, antirracista, antripatriarcal, anticolonialista e anti-imperialista. Faz uma narrativa de sua trajetória enquanto mulher militante, curiosa e engajada nos movimentos de educação política e cultural, desde criança, enquanto vivia na ilha de Reunião, colônia francesa. O tema é, então, familiar à autora que defende que vivenciou experiências de exploração, opressão, tornando-se defensora da luta anticolonial. Para ela, não há que se falar de feminismo sem uma análise dos conflitos, das contradições e resistências dos povos. Dizer-se feminista decolonial é afirmar a fidelidade às lutas das mulheres do Sul global desde a colonização aos dias atuais.

Como resultado dessa crítica, a autora compreende “feminismo decolonial” como a despatriarcalização das lutas revolucionárias travadas durante séculos por parte da humanidade para afirmar seu direito à existência. Esse movimento data do início do século XXI e provoca uma reação violenta nos heteropatriarcados, nas feministas do Norte e nos governos. Prega oposição ao nacionalismo autoritário e ao neofascismo, que consideram as feministas racializadas inimigas a serem abatidas. No tocante à epistemologia, os feminismos de política decolonial se inscrevem no amplo movimento de reapropriação científica e filosófica que revisa a narrativa europeia do mundo. É necessário reivindicar a igualdade entre os saberes e contestar a ordem do saber imposto pelo Ocidente. É necessário estudar o modo como o complexo racismo/sexismo/etnicismo impregna todas as relações de dominação, já que mesmo após a descolonização os mecanismos de colonialidade estão mantidos.

A autora defende um feminismo que pense conjuntamente o ecossistema político, econômico, cultural e social, buscando evitar a segmentação imposta pelo método ocidental das ciências sociais, que precisa ser defendido, desenvolvido, afirmado e colocado em prática. Ela ressalta a necessidade de reconhecer os privilégios das mulheres brancas nas narrativas hegemônicas das lutas pelos direitos das mulheres que contribui para esvaziá-las de alcance político, se apresenta como um discurso que não questiona as estruturas do capitalismo e que transforma as mulheres em sujeito social hegemônico. Assim, continua, é necessário mostrar o lugar que mulheres escravas, quilombolas, trabalhadoras engajadas e colonizadas ocuparam na luta pela liberdade e igualdade racial, desconstruir os mecanismos de exploração e de dominação que elaboram um discurso ofensivo, a favor do Estado e do capital neoliberal que objetivam enfraquecer os feminismos de política decolonial.

O capítulo 2 – “A evolução para um feminismo civilizatório para o século XXI” – aponta as formas de manifestação global de dominação do patriarcado e tece críticas aos movimentos feministas europeus que se veem como a vanguarda de um movimento de caráter neoliberal pelos direitos das mulheres, focados na discriminação de gênero sem abarcar as novas formas de desigualdade entre as mulheres. A autora traz exemplos de pensadoras feministas próximas às ideologias da extrema direita (o feminismo corporativo) e atribui as desigualdades entre homens e mulheres a uma questão de mentalidade baseada em uma concepção idealista das relações sociais.

Vergés apresenta o termo “femonacionalismo”, cunhado por Sara Farris, que diz respeito à exploração de temas feministas por nacionalistas e neoliberais islamofóbicos e ao modo como feministas contribuem para a estigmatização de homens muçulmanos. Por esse pensamento, as mulheres devem ser salvas da dominação masculina por meio  da inserção no mercado de trabalho neoliberal, em serviços domésticos, cuidados de idosos, de crianças ou empregos em serviços de limpeza que garantam às mulheres brancas das classes médias europeias acesso a uma vida profissional. Há nesse modelo de feminismo uma repressão ao passado colonial/racial e à reorganização do capitalismo, permanecendo impensadas pelas feministas metropolitanas no momento “pós-colonial”.

Uma das armas ideológicas do feminismo civilizatório consiste em integrar algumas figuras cuidadosamente selecionadas e embranquecê-las, a exemplo de Rosa Parks, ícone da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos, que teve sua imagem de militância desassociada do feminismo radical. Há várias formas de despolitizar militantes, seja fazendo-a heroína da democracia ocidental (mascarando as persistentes desigualdades fazendo do racismo uma doença de alguns/algumas), seja atacando e ofendendo sua imagem ou condenando-a ao esquecimento. A autora propõe que as feministas decoloniais ajam de modo implacável na recuperação da história de luta de mulheres escravizadas e quilombolas que vivenciaram um feminismo antirracista e anticolonial a partir do século XVI.

É preciso trazer à luz as contribuições desses feminismos antirracistas e anticoloniais, já que o feminismo civilizatório reescreveu a história das lutas das mulheres para minar ou desabonar as ações das mulheres do Sul nas lutas anticoloniais e anti-imperialistas. Essas mulheres não aceitam a análise dos mecanismos e a ideologia das políticas masculinistas e heteropatriarcais feita por mulheres que, ao defenderem o feminismo decolonial, reconhecem a existência da violência sistêmica contra as mulheres e combatem o retorno de estruturas opressivas nos Estados emergentes com a descolonização.

A autora ainda apresenta duas formas opostas de patriarcado. No primeiro, a pessoa se diz moderna, a favor de certo multiculturalismo, e afirma respeitar os direitos das mulheres desde que isso implique integrá-las na economia neoliberal. O outro patriarcado, neofascista e masculinista, ataca frontalmente as mulheres e os LGBTQIT+ e visa fazer retroceder direitos duramente conquistados pelas mulheres (aborto, contracepção, direito do trabalho, direitos LGBTQIT+) e pessoas trans.

Joana Ribeiro Zimmer, juíza da Comarca de Tijucas (SC), induz menina de 11 anos, grávida após estubro, a desistir de aborto legal. Foto Solon Soares/Assembleia Legislativa de Santa Catarina/The Intercept

Nesse sistema, só é aceitável a submissão das mulheres à sua ordem heteronormativa, que institui o poder absoluto do pai e do marido, a ação do patriarcado que manipula a religião e descobriu como despertar o ódio e o medo para justificar assassinatos – a exemplo do patriarcado neofascista, neoliberal, masculinista e virilista que executou a vereadora negra e queer, Marielle Franco.

Aproximando-se do final da obra, a autora declara que a politização dos serviços de cuidado atribuídos às mulheres racializadas, o engajamento do feminismo negro a partir dos anos de 1970 e o uso da interseccionalidade na abordagem da noção de trabalho revelam todo o caráter opressor do sistema capitalista. Para ela, compreender o feminismo decolonial é problematizar a implementação de políticas em torno do trabalho doméstico como trabalho produtivo, já que muitas são indiferentes à organização do trabalho de limpeza/cuidado e à sua racialização.

Retomando a aspectos apontados na introdução da obra, Vergès aborda o desgaste e a fadiga dos corpos racializados cujo trabalho consiste em cuidar de outros seres/animais, em limpar as cidades nas quais o  lixo deve desaparecer aos olhos de quem tem direito a uma boa vida. Quem limpa o mundo? A indústria de limpeza/cuidado é um dos exemplos mais claros do funcionamento do capitalismo racial, que expõe mulheres racializadas a produtos químicos tóxicos, a assédio e à violência sexual, à invisibilização, à exploração, à organização legal e ilegal da imigração como a negação de direitos. Segundo a autora, analisar os trabalhos de limpeza e cuidado nas configurações atuais do capitalismo racial e do feminismo civilizatório é uma tarefa de primeira ordem para as feministas decoloniais.

Finalizando o texto, a autora indica pôr em prática um pensamento utópico, entendido como energia e força de insurreição, como presença e como convite para sonhos emancipatórios, como gesto de ruptura: ousar pensar para além do que se apresenta como ‘natural’ e, ‘pragmático’ e ‘razoável’. (p. n.121-136)

A autora desse livro, mulher negra e especialista em estudos pós-coloniais, toma por base a sua trajetória de vida para criticar movimento feminista que ela chama de civilizatório e propor um feminismo decolonial, aberto a questionamentos.

O feminismo decolonial é uma nova política de pensamento que enfatiza as lutas empreendidas por mulheres racializadas, intencionalmente invisibilizadas ao longo da história por uma narrativa eurocêntrica e ocidental e até mesmo pela luta feminista limitada às discussões de igualdade de gênero, propostas por mulheres brancas ocidentais.

O livro também ressalta o capitalismo, o neoliberalismo e o imperialismo como sistemas a serem combatidos por uma episteme antirracista, anticolonial, antipatriarcalista e anti-imperialista. Nesse sentido,   cumpre de forma concisa os objetivos anunciados, pois informa sobre a necessidade de pensarmos o feminismo do ponto de vista da decolonialidade, questiona a universalização do feminismo europeu por não representar igualdade entre as mulheres e nos convoca a elaborar um movimento multidimensional frente à recolonialidade liberal em curso.

Apesar da concisão, da objetividade e da coerência elencadas acima, o livro apresenta alguns problemas pouco expressivos, mas que, em alguns momentos, dificultam a inteligibilidade do argumento. O primeiro deles está na referenciação de fontes e autoridades. A prática de usar notas de rodapé indicativas de material e de não exemplificar o conteúdo abordado nas notas, inserindo o argumento e a interpretação no decorrer do texto). Essa prática nem sempre facilita a compreensão pelo leitor que busca na obra o primeiro contato com o pensamento feminista decolonial.

Por outro lado, o fato de os conceitos norteadores da obra serem apresentados no decorrer da escrita, relacionados à crítica daquilo a que se opõe, concede à obra um tom de manifesto e de convite para pensarmos sobre um movimento transformador da história social de mulheres negras e racializadas. Além disso, a teoria destacada na obra visa à liberação de toda a sociedade oprimida pela rede de opressão e de desigualdade tão característicos do projeto neoliberal especialmente no Sul global.

O livro traz fontes históricas relevantes sobre aos movimentos de emancipação das colônias francesas a partir de 1960 e as manifestações feministas do século XX na Europa e nos Estados Unidos. Traz, também, referências a artigos científicos sobre eventos que a autora aponta como evidências de fortaleza do feminismo civilizatório e dos movimentos que nos permitem entender sobre o contexto de crescimento da islamofobia na França e ainda, a violência de gênero sobre mulheres racializadas no contexto de ascensão do neoliberalismo, como por exemplo, o caso da vereadora brasileira Marielle Franco.

Desta forma, a apresentação dos contextos históricos de luta relacionando-os à crítica ao feminismo convencional (na medida em que apresenta uma proposta antirracista, antipatriarcalista, anti-imperialista e anticapitalista) nos aproxima da ideologia decolonial, da necessidade de decolonizar as instituições e o conhecimento para combatermos o capitalismo racial estruturante.

A obra é precisa ao questionar o feminismo liberal, ao apresentar o conceito de feminismo civilizatório como uma ideologia sobre as mulheres que ainda não se decolonizaram, ao apresentar a proposta de estudos feministas sobre a perspectiva decolonial, pois embora descolonizado, o Sul global se estrutura em relações coloniais, na colonialidade de corpos de pessoas racializadas vítimas de opressão do sistema neoliberal.

A obra também apresenta a perspectiva multidimensional como fundamental para entendermos as conexões entre raça, capital, sexo, patriarcado e imperialismo. Comunica o conceito de feminismo decolonial com base em pensamento de autores/teóricos do Sul global, como Aimé Cesaire, Frantz Fanon, Gayatri Spivak, María Lugones, Lélia Gonzalez, Oyèrónké Oyewùmí, que corroboram com a crítica feita pela autora à universalização do pensamento de gênero feminista europeu, defensor, por exemplo, do fato de   mulheres brancas possuírem  propriedades escravagistas nas colônias francesas do século XVIII, embora destituídas de direitos políticos. O livro expõe manifestações e pensamentos de autores e feministas que corroboram com a crítica feita pela autora e, o mais relevante, com um conceito aberto a questionamentos e considerando pensamentos opostos.

Por tudo descrito até aqui, a obra é introduz o leitor a um feminismo decolonial, pois instiga a crítica, convoca as leitoras a uma transformação radical de teoria e prática. Refere-se às mulheres negras e racializadas como estruturantes da sociedade, devendo ser estudadas e de ter sua história narrada em uma perspectiva crítica e de visibilidade. O livro é um instrumento poderoso para uma nova e necessária leitura sobre o  feminismo.

Sumário de Um feminismo decolonial

  • Por um feminismo radical
  • Nota da tradução
  • Prefácio à edição brasileira
  • 1. Invisíveis, elas “abrem a cidade”
  • 2. Definir um campo: O feminismo decolonial
  • 3. A Evolução para um feminismo civilizatório do século XXI
  • Sobre a autora
  • Créditos

Resenhista

Viviane Andrade Passos é professora da Escola Municipal Tiradentes (SEMED/NSG) e  do Colégio Estadual Cícero Bezerra (SEDUC-SE), ambos no município de Nossa Senhora da Glória-SE. Aluna do Mestrado em Ensino de História da Universidade Federal de Sergipe. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7026713252936689; ID: https://orcid.org/0000-0003-4077-3916; Facebook: /viviane.andrade.56863; Instagram: vivi.andrade_23 E-mail: [email protected].


Para citar esta resenha

VERGÈS, Françoise. Um feminismo decolonial. São Paulo: Ubu Editora, 2020. 144 pp. Resenha de: PASSOS, Viviane Andrade. Proposta crítica e multidimensional para um novo feminismo. Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n.5, jul./ago. 2022. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/proposta-critica-e-multidimensional-para-um-novo-feminismo-resenha-de-um-feminismo-decolonial-de-francoise-verges/>


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA)

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.2,n6, jul./ago. 2022 | ISSN 2764-2666

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Proposta crítica e multidimensional para um novo feminismo – Resenha de “Um Feminismo Decolonial”, de Françoise Vergès

Resenhado por Viviane Andrade Passos (SEMED-NSG/UFS) | ID: https://orcid.org/0000-0003-4077-3916.


Françoise Vergès (2020) | Imagem: Anthony Francin/Divulgação

Un féminisme décolonial, [Um Feminismo Decolonial], de Françoise Vergés, reivindica uma teoria multidimensional do movimento feminista: antirracista, antipatriarcal, anticolonial e anticapitalista. O livro também tece críticas ao movimento feminista civilizatório. Apresentado inicialmente por Flávia Rios, no texto ‘Por um feminismo radical’, traduzido por Jamille Pinheiro Dias e Raquel Camargo. A obra é construída por um prefácio à edição brasileira, da própria autora, uma introdução – “Invisíveis, elas “abrem a cidade” – e dois capítulos: “Definir um campo: o Feminismo Decolonial” e “A evolução para um feminismo civilizatório do século XXI”. O livro resulta dos estudos da autora sobre o pensamento feminista e a decolonialidade, publicado originariamente na França, em 2019, e lançado em português, no Brasil, pela Ubu Editora, em 2020.

Françoise Vergés é cientista política, historiadora, ativista e especialista em estudos pós-coloniais. Graduou-se em Ciências Políticas e Estudos Feministas na San Diego State University (1989) e tornou-se PhD em Teoria Política pela Berkeley University of California (1995) com a tese “Monsters and Revolutionaries: Colonial Family Romance and Métissage” [Monstros e revolucionários: o romance e a mestiçagem da família colonial] (Duke University Press, 1999). Vergés lecionou na Sussex University e na Goldsmiths College (Inglaterra). De 2009 a 2012, presidiu o comitê nacional francês de preservação da memória e da história da escravidão. Entre 2014 e 2018, foi titular do programa Global South(s) no Collège d’études mondiales da Fondation Maison des Sciences de l’Homme e publicou diversos artigos sobre Frantz Fanon, Aimé Césaire, abolicionismo, psiquiatria colonial e pós-colonial, memória da escravidão, processos de creolização no Oceano Índico e novas formas de colonização e racialização. Trabalha regularmente com artistas, tendo sido coautora dos documentários “Aimé Césaire face aux révoltes du monde” [Aimé Césaire em face das revoltas do mundo] e “Maryse Condé: une voix singulière” [Maryse Condé: uma voz singular] (Jérôme-Cécile Auffret, 2002; Paris Triennale, 2012). Vergé também organizou as exposições “L’Esclave au Louvre: une humanité invisible” [O escravo no Louvre: uma humanidade invisível] (Museu do Louvre, 2013), “Dix femmes puissantes” [Dez mulheres poderosas], (2013), e “Haiti, medo dos opressores, esperança dos oprimidos” (2014), ambas para o Mémorial de l’abolition de l’esclavage, de Nantes. (p.139-140)

Este livro representa um manifesto cientificamente crítico ao definir um conceito capaz de provocar transformações nos estudos sobre gênero e pensamento feminista para além da interseccionalidade. Ele apresenta uma teoria, ainda que aberta a questionamentos, sobre a multidimensionalidade do feminismo decolonial a partir de debates sobre a permanência da estrutura colonial em sociedades do Sul Global que, embora descolonizadas, permanecem arraigadas em estruturas sociais de colonialidade.

A nota introdutória de Flávia Rios – “Por um Feminismo Radical” – destaca a crítica breve e incendiária ao eurocentrismo presente no pensamento feminista e declara que o livro defende um feminismo radical, antipatriarcal, anticolonial e anticapitalista capaz de transformar as estruturas coloniais e reconhece a importância de problematizarmos o feminismo, principalmente, em seu caráter de “feminismo civilizatório.”

Na nota da tradução, Dias e Camargo esclarecem que a conversão de décolonial em francês para decolonial em português significa o enfrentamento da colonialidade do poder que persiste como legado da modernidade do capitalismo e do racismo. Ela difere da expressão descolonial, referente aos processos histórico-administrativos de desligamento das metrópoles às ex-colônias, já que estes não garantem que os discursos que circulam nele superem a lógica colonial.

No prefácio, a autora relata a motivação para a escrita do livro: a invisibilidade de um trabalho marcado pelo gênero, subqualificado e racializado, mas essencial à estrutura e funcionamento do patriarcado e do capitalismo. Ela também o escreveu para dar visibilidade à dimensão colonial e racial do feminismo civilizatório que, ao igualar a mulher ao homem, atribui às mulheres direitos que servem mais aos interesses neoliberais e imperialistas de exploração e opressão. Para a autora, a epidemia de Covid 19 escancarou a vulnerabilidade das mulheres racializadas expostas a várias formas de violência, a trabalhos insalubres, em que  o confinamento foi uma política para os ricos.

Na introdução – ‘Invisíveis, elas “abrem a cidade” –, a autora expõe a árdua e incansável tarefa das mulheres racializadas de limparem o mundo e a necessidade de manter invisível esse trabalho para a manutenção do capitalismo em que mulheres da burguesia gozam de uma vida confortável em detrimento da exploração de milhões de mulheres racializadas do Sul global, o que constitui a principal crítica da obra já que a autora atribui essa organização ao capitalismo racial e ao heteropatriarcado.

O capítulo 1 – “Definir um campo: o feminismo decolonial” – é subdividido em tópicos que apresentam uma definição sobre o feminismo decolonial, a partir da exposição histórica do movimento feminista. Ele critica a ideologia feminista nacionalista, civilizatória e xenófoba, tipificando-o como um arsenal para a direita neoliberal modernizadora. Esse tipo de feminismo defende apenas as questões de gênero e de igualdade de direitos postas a serviço do capital, do Estado e do império e desconsideram a luta por justiça social, dignidade e respeito. Esse “feminismo civilizatório” reduz as aspirações revolucionárias das mulheres à demanda por divisão igualitária dos privilégios concedidos aos homens brancos em razão da supremacia racial branca. Cúmplices ativas da ordem capitalista racial, as feministas civilizatórias não hesitam em apoiar políticas de intervenção imperialistas, políticas islamofóbicas ou negrofóbicas.

A autora convoca o leitor para um movimento de militância anticolonial, antirracista, antripatriarcal, anticolonialista e anti-imperialista. Faz uma narrativa de sua trajetória enquanto mulher militante, curiosa e engajada nos movimentos de educação política e cultural, desde criança, enquanto vivia na ilha de Reunião, colônia francesa. O tema é, então, familiar à autora que defende que vivenciou experiências de exploração, opressão, tornando-se defensora da luta anticolonial. Para ela, não há que se falar de feminismo sem uma análise dos conflitos, das contradições e resistências dos povos. Dizer-se feminista decolonial é afirmar a fidelidade às lutas das mulheres do Sul global desde a colonização aos dias atuais.

Como resultado dessa crítica, a autora compreende “feminismo decolonial” como a despatriarcalização das lutas revolucionárias travadas durante séculos por parte da humanidade para afirmar seu direito à existência. Esse movimento data do início do século XXI e provoca uma reação violenta nos heteropatriarcados, nas feministas do Norte e nos governos. Prega oposição ao nacionalismo autoritário e ao neofascismo, que consideram as feministas racializadas inimigas a serem abatidas. No tocante à epistemologia, os feminismos de política decolonial se inscrevem no amplo movimento de reapropriação científica e filosófica que revisa a narrativa europeia do mundo. É necessário reivindicar a igualdade entre os saberes e contestar a ordem do saber imposto pelo Ocidente. É necessário estudar o modo como o complexo racismo/sexismo/etnicismo impregna todas as relações de dominação, já que mesmo após a descolonização os mecanismos de colonialidade estão mantidos.

A autora defende um feminismo que pense conjuntamente o ecossistema político, econômico, cultural e social, buscando evitar a segmentação imposta pelo método ocidental das ciências sociais, que precisa ser defendido, desenvolvido, afirmado e colocado em prática. Ela ressalta a necessidade de reconhecer os privilégios das mulheres brancas nas narrativas hegemônicas das lutas pelos direitos das mulheres que contribui para esvaziá-las de alcance político, se apresenta como um discurso que não questiona as estruturas do capitalismo e que transforma as mulheres em sujeito social hegemônico. Assim, continua, é necessário mostrar o lugar que mulheres escravas, quilombolas, trabalhadoras engajadas e colonizadas ocuparam na luta pela liberdade e igualdade racial, desconstruir os mecanismos de exploração e de dominação que elaboram um discurso ofensivo, a favor do Estado e do capital neoliberal que objetivam enfraquecer os feminismos de política decolonial.

O capítulo 2 – “A evolução para um feminismo civilizatório para o século XXI” – aponta as formas de manifestação global de dominação do patriarcado e tece críticas aos movimentos feministas europeus que se veem como a vanguarda de um movimento de caráter neoliberal pelos direitos das mulheres, focados na discriminação de gênero sem abarcar as novas formas de desigualdade entre as mulheres. A autora traz exemplos de pensadoras feministas próximas às ideologias da extrema direita (o feminismo corporativo) e atribui as desigualdades entre homens e mulheres a uma questão de mentalidade baseada em uma concepção idealista das relações sociais.

Vergés apresenta o termo “femonacionalismo”, cunhado por Sara Farris, que diz respeito à exploração de temas feministas por nacionalistas e neoliberais islamofóbicos e ao modo como feministas contribuem para a estigmatização de homens muçulmanos. Por esse pensamento, as mulheres devem ser salvas da dominação masculina por meio  da inserção no mercado de trabalho neoliberal, em serviços domésticos, cuidados de idosos, de crianças ou empregos em serviços de limpeza que garantam às mulheres brancas das classes médias europeias acesso a uma vida profissional. Há nesse modelo de feminismo uma repressão ao passado colonial/racial e à reorganização do capitalismo, permanecendo impensadas pelas feministas metropolitanas no momento “pós-colonial”.

Uma das armas ideológicas do feminismo civilizatório consiste em integrar algumas figuras cuidadosamente selecionadas e embranquecê-las, a exemplo de Rosa Parks, ícone da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos, que teve sua imagem de militância desassociada do feminismo radical. Há várias formas de despolitizar militantes, seja fazendo-a heroína da democracia ocidental (mascarando as persistentes desigualdades fazendo do racismo uma doença de alguns/algumas), seja atacando e ofendendo sua imagem ou condenando-a ao esquecimento. A autora propõe que as feministas decoloniais ajam de modo implacável na recuperação da história de luta de mulheres escravizadas e quilombolas que vivenciaram um feminismo antirracista e anticolonial a partir do século XVI.

É preciso trazer à luz as contribuições desses feminismos antirracistas e anticoloniais, já que o feminismo civilizatório reescreveu a história das lutas das mulheres para minar ou desabonar as ações das mulheres do Sul nas lutas anticoloniais e anti-imperialistas. Essas mulheres não aceitam a análise dos mecanismos e a ideologia das políticas masculinistas e heteropatriarcais feita por mulheres que, ao defenderem o feminismo decolonial, reconhecem a existência da violência sistêmica contra as mulheres e combatem o retorno de estruturas opressivas nos Estados emergentes com a descolonização.

A autora ainda apresenta duas formas opostas de patriarcado. No primeiro, a pessoa se diz moderna, a favor de certo multiculturalismo, e afirma respeitar os direitos das mulheres desde que isso implique integrá-las na economia neoliberal. O outro patriarcado, neofascista e masculinista, ataca frontalmente as mulheres e os LGBTQIT+ e visa fazer retroceder direitos duramente conquistados pelas mulheres (aborto, contracepção, direito do trabalho, direitos LGBTQIT+) e pessoas trans.

Joana Ribeiro Zimmer, juíza da Comarca de Tijucas (SC), induz menina de 11 anos, grávida após estubro, a desistir de aborto legal. Foto Solon Soares/Assembleia Legislativa de Santa Catarina/The Intercept

Nesse sistema, só é aceitável a submissão das mulheres à sua ordem heteronormativa, que institui o poder absoluto do pai e do marido, a ação do patriarcado que manipula a religião e descobriu como despertar o ódio e o medo para justificar assassinatos – a exemplo do patriarcado neofascista, neoliberal, masculinista e virilista que executou a vereadora negra e queer, Marielle Franco.

Aproximando-se do final da obra, a autora declara que a politização dos serviços de cuidado atribuídos às mulheres racializadas, o engajamento do feminismo negro a partir dos anos de 1970 e o uso da interseccionalidade na abordagem da noção de trabalho revelam todo o caráter opressor do sistema capitalista. Para ela, compreender o feminismo decolonial é problematizar a implementação de políticas em torno do trabalho doméstico como trabalho produtivo, já que muitas são indiferentes à organização do trabalho de limpeza/cuidado e à sua racialização.

Retomando a aspectos apontados na introdução da obra, Vergès aborda o desgaste e a fadiga dos corpos racializados cujo trabalho consiste em cuidar de outros seres/animais, em limpar as cidades nas quais o  lixo deve desaparecer aos olhos de quem tem direito a uma boa vida. Quem limpa o mundo? A indústria de limpeza/cuidado é um dos exemplos mais claros do funcionamento do capitalismo racial, que expõe mulheres racializadas a produtos químicos tóxicos, a assédio e à violência sexual, à invisibilização, à exploração, à organização legal e ilegal da imigração como a negação de direitos. Segundo a autora, analisar os trabalhos de limpeza e cuidado nas configurações atuais do capitalismo racial e do feminismo civilizatório é uma tarefa de primeira ordem para as feministas decoloniais.

Finalizando o texto, a autora indica pôr em prática um pensamento utópico, entendido como energia e força de insurreição, como presença e como convite para sonhos emancipatórios, como gesto de ruptura: ousar pensar para além do que se apresenta como ‘natural’ e, ‘pragmático’ e ‘razoável’. (p. n.121-136)

A autora desse livro, mulher negra e especialista em estudos pós-coloniais, toma por base a sua trajetória de vida para criticar movimento feminista que ela chama de civilizatório e propor um feminismo decolonial, aberto a questionamentos.

O feminismo decolonial é uma nova política de pensamento que enfatiza as lutas empreendidas por mulheres racializadas, intencionalmente invisibilizadas ao longo da história por uma narrativa eurocêntrica e ocidental e até mesmo pela luta feminista limitada às discussões de igualdade de gênero, propostas por mulheres brancas ocidentais.

O livro também ressalta o capitalismo, o neoliberalismo e o imperialismo como sistemas a serem combatidos por uma episteme antirracista, anticolonial, antipatriarcalista e anti-imperialista. Nesse sentido,   cumpre de forma concisa os objetivos anunciados, pois informa sobre a necessidade de pensarmos o feminismo do ponto de vista da decolonialidade, questiona a universalização do feminismo europeu por não representar igualdade entre as mulheres e nos convoca a elaborar um movimento multidimensional frente à recolonialidade liberal em curso.

Apesar da concisão, da objetividade e da coerência elencadas acima, o livro apresenta alguns problemas pouco expressivos, mas que, em alguns momentos, dificultam a inteligibilidade do argumento. O primeiro deles está na referenciação de fontes e autoridades. A prática de usar notas de rodapé indicativas de material e de não exemplificar o conteúdo abordado nas notas, inserindo o argumento e a interpretação no decorrer do texto). Essa prática nem sempre facilita a compreensão pelo leitor que busca na obra o primeiro contato com o pensamento feminista decolonial.

Por outro lado, o fato de os conceitos norteadores da obra serem apresentados no decorrer da escrita, relacionados à crítica daquilo a que se opõe, concede à obra um tom de manifesto e de convite para pensarmos sobre um movimento transformador da história social de mulheres negras e racializadas. Além disso, a teoria destacada na obra visa à liberação de toda a sociedade oprimida pela rede de opressão e de desigualdade tão característicos do projeto neoliberal especialmente no Sul global.

O livro traz fontes históricas relevantes sobre aos movimentos de emancipação das colônias francesas a partir de 1960 e as manifestações feministas do século XX na Europa e nos Estados Unidos. Traz, também, referências a artigos científicos sobre eventos que a autora aponta como evidências de fortaleza do feminismo civilizatório e dos movimentos que nos permitem entender sobre o contexto de crescimento da islamofobia na França e ainda, a violência de gênero sobre mulheres racializadas no contexto de ascensão do neoliberalismo, como por exemplo, o caso da vereadora brasileira Marielle Franco.

Desta forma, a apresentação dos contextos históricos de luta relacionando-os à crítica ao feminismo convencional (na medida em que apresenta uma proposta antirracista, antipatriarcalista, anti-imperialista e anticapitalista) nos aproxima da ideologia decolonial, da necessidade de decolonizar as instituições e o conhecimento para combatermos o capitalismo racial estruturante.

A obra é precisa ao questionar o feminismo liberal, ao apresentar o conceito de feminismo civilizatório como uma ideologia sobre as mulheres que ainda não se decolonizaram, ao apresentar a proposta de estudos feministas sobre a perspectiva decolonial, pois embora descolonizado, o Sul global se estrutura em relações coloniais, na colonialidade de corpos de pessoas racializadas vítimas de opressão do sistema neoliberal.

A obra também apresenta a perspectiva multidimensional como fundamental para entendermos as conexões entre raça, capital, sexo, patriarcado e imperialismo. Comunica o conceito de feminismo decolonial com base em pensamento de autores/teóricos do Sul global, como Aimé Cesaire, Frantz Fanon, Gayatri Spivak, María Lugones, Lélia Gonzalez, Oyèrónké Oyewùmí, que corroboram com a crítica feita pela autora à universalização do pensamento de gênero feminista europeu, defensor, por exemplo, do fato de   mulheres brancas possuírem  propriedades escravagistas nas colônias francesas do século XVIII, embora destituídas de direitos políticos. O livro expõe manifestações e pensamentos de autores e feministas que corroboram com a crítica feita pela autora e, o mais relevante, com um conceito aberto a questionamentos e considerando pensamentos opostos.

Por tudo descrito até aqui, a obra é introduz o leitor a um feminismo decolonial, pois instiga a crítica, convoca as leitoras a uma transformação radical de teoria e prática. Refere-se às mulheres negras e racializadas como estruturantes da sociedade, devendo ser estudadas e de ter sua história narrada em uma perspectiva crítica e de visibilidade. O livro é um instrumento poderoso para uma nova e necessária leitura sobre o  feminismo.

Sumário de Um feminismo decolonial

  • Por um feminismo radical
  • Nota da tradução
  • Prefácio à edição brasileira
  • 1. Invisíveis, elas “abrem a cidade”
  • 2. Definir um campo: O feminismo decolonial
  • 3. A Evolução para um feminismo civilizatório do século XXI
  • Sobre a autora
  • Créditos

Resenhista

Viviane Andrade Passos é professora da Escola Municipal Tiradentes (SEMED/NSG) e  do Colégio Estadual Cícero Bezerra (SEDUC-SE), ambos no município de Nossa Senhora da Glória-SE. Aluna do Mestrado em Ensino de História da Universidade Federal de Sergipe. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7026713252936689; ID: https://orcid.org/0000-0003-4077-3916; Facebook: /viviane.andrade.56863; Instagram: vivi.andrade_23 E-mail: [email protected].


Para citar esta resenha

VERGÈS, Françoise. Um feminismo decolonial. São Paulo: Ubu Editora, 2020. 144 pp. Resenha de: PASSOS, Viviane Andrade. Proposta crítica e multidimensional para um novo feminismo. Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n.5, jul./ago. 2022. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/proposta-critica-e-multidimensional-para-um-novo-feminismo-resenha-de-um-feminismo-decolonial-de-francoise-verges/>


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA)

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.2,n6, jul./ago. 2022 | ISSN 2764-2666

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