Sertanidade e aprendizagem histórica – Revisão da literatura | Sandra Maria dos Santos (SEC/Euclides da Cunha-BA)

Apresentação de Quadrilha em Euclides da Cunha [2021] | Imagem: Prefeitura Municipal de Euclides da Cunha
Resumo: Este artigo de revisão analisa a cultura popular sertaneja, focando em festas juninas e literatura de cordel no Nordeste brasileiro (2018–2022). Utiliza uma abordagem interdisciplinar para explorar a identidade cultural, espaço e territorialidades do sertão, sugerindo pesquisas futuras para compreender melhor esses elementos na educação histórica.

Palavras-chave: Sertão, Sertanidade, Festa Junina, Literatura de Cordel.


Introdução

No presente artigo, revisamos a literatura especializada sobre elementos identitários da cultura popular presentes no sertão nordestino que contribuem no processo de afirmação da identidade sertaneja. Dentre esses elementos, destacamos a cultura junina e a literatura de cordel, buscando subsídios para refinar um projeto de pesquisa que elucide as seguintes indagações: Quais elementos dos festejos juninos podem ser empregados como ferramentas para o ensino de história, com o intuito de reafirmar o sentimento de pertencimento de estudantes ao sertão baiano? Como a literatura de cordel pode potencializar essa abordagem em sala de aula? Este estudo integra uma pesquisa de mestrado intitulada A festa de São João, a sertanidade e o cordel no ensino de História como elementos identitários de pertencimento ao sertão euclidense, desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-graduação do Mestrado Profissional em Ensino de História (ProfHistória), na Universidade Federal de Sergipe — UFS/SE, durante o biênio 2023–2024.

O levantamento foi empreendido entre agosto e outubro de 2023, com base nos trabalhos registrados no banco de dados do Catálogo de Teses e Dissertações da Fundação CAPES, produzidos entre 2018 e 2022, nas áreas das ciências humanas, com ênfase em ensino de História. A escolha desses trabalhos foi orientada pela presença dos seguintes descritores: “sertão”, “sertanidade”, “identidade sertaneja”, “cultura popular”, “festa junina”, “festa de São João”, “identidade cultural” e “literatura de cordel”.

Resultados

No decorrer da pesquisa identificamos 159 trabalhos que abordam questões pertinentes a cultura e a identidade sertaneja. Aproximadamente 135 (85%) dessas pesquisas foram divulgadas na forma de dissertações, enquanto os 24 (15%) restantes se apresentaram sob a forma de teses de doutorado. Vale destacar que esses números não englobam a totalidade que priorizamos para a análise de títulos. Enfatizamos que apenas 1/5 desse material abrange dois ou mais descritores e está mais alinhado ao nosso tema de pesquisa, que envolve questões relacionadas à identidade sertaneja, à cultura junina e à literatura de cordel. Por essa razão, optamos por selecionar apenas 12 textos para uma leitura integral.

A distribuição percentual desse levantamento reflete uma ênfase significativa na cultura popular, constituindo 43% do total. Esse segmento, contempla entre outros elementos as festas juninas e literatura de cordel, que são como peças centrais da nossa investigação no mestrado. Além disso, há uma atenção considerável dedicada às representações do sertão, abrangendo 14% do escopo da pesquisa. As categorias de identidades e relações étnico-raciais compartilham uma porcentagem semelhante, cada uma com 10%, indicando uma abordagem equilibrada na análise de diferentes identidades culturais e suas implicações.

O ensino de história é abordado em 9% dos textos, sugerindo uma preocupação em compreender como esses temas são incorporados no ambiente educacional. A educação, com 6%, e políticas públicas, com 4%, ampliam a perspectiva para considerações mais amplas sobre o impacto social e governamental desses elementos culturais. Apenas 1% dos títulos não estão diretamente alinhados às propostas de pesquisa, destacando uma coesão geral no escopo do estudo. Essa distribuição sugere uma abordagem abrangente e equilibrada, integrando diversos aspectos para uma compreensão mais completa do fenômeno cultural examinado.

Ao analisar os títulos pesquisados, percebe-se uma diversidade de temas abordando o sertão, que vão desde questões culturais e literárias até aspectos políticos e sociais. Os títulos evidenciam uma variedade temática, cobrindo não apenas a geografia física do sertão, mas também suas complexidades culturais, históricas e sociais. Isso reflete uma abordagem abrangente para compreender a região. A presença de títulos que abordam temas literários, históricos, antropológicos e sociológicos destaca a interdisciplinaridade na análise do sertão. Isso é positivo, pois permite uma compreensão mais profunda e rica da região. Muitos títulos exploram a identidade cultural e a relação entre as pessoas e o território sertanejo. Essa ênfase pode proporcionar uma compreensão significativa sobre como as comunidades locais percebem e constroem sua própria identidade.

Títulos como Os Sertões Naturais sobre as Lentes de Oswaldo Lamartine de Faria (1940–1980) (Araujo, 2022) sugerem uma abordagem visual, trazendo uma dimensão estética para a compreensão do sertão, isso é proveitoso para uma apreciação mais holística da região. Alguns títulos focam em vozes e perspectivas marginalizadas, como Vastas e Ermas: Mulheres Não Brancas no Sertão do Rio Grande (Seridó, séculos XVIII E XIX), (Santos, 2022), iniciativas fundamentais para uma representação mais justa e inclusiva da diversidade existente no sertão. Títulos como Captura dos sertões na rede: um olhar sobre os sertões contemporâneos divulgados/visualizados nas mídias digitais (2018–2020), (Medeiros, 2022), indicam uma atenção à contemporaneidade, explorando como o sertão é representado e percebido na era digital, adicionando uma dimensão moderna e relevante à pesquisa.

A presença de títulos que abordam programas governamentais, movimentos sociais e questões de classe revela uma consideração pelas dinâmicas políticas e sociais que moldam a vida no sertão. A inclusão de títulos que exploram a cultura popular como em SÁ (2021), Festa de São João Batista da Rua do Capim (Goiás, Go): registro audiovisual como possibilidade de fortalecimento da memória e da identidade no lugar, bem como títulos que abordam a literatura de cordel e a voz indígena ressaltam a importância de considerar diversas perspectivas na compreensão do sertão.

Ao mergulharmos nesse contexto, somos levados a explorar as intricadas relações entre identidades culturais, espacialidades e territorialidades, desvendando assim o sertão como um território simbólico onde as nuances da cultura se manifestam de maneira singular. A cultura popular se revela, assim, como uma arena vibrante onde identidades individuais e coletivas ganham forma e substância.

O título, O sertão é neon: transversalidades e pluralidades de identidades de gêneros no filme boi neon de Gabriel Mascaro (Azevedo, 2022) proporciona uma análise rica e contextualizada do sertão e suas representações. A análise do filme “Boi Neon” oferece uma oportunidade para discutir como a cultura popular e a identidade sertaneja são representadas no cinema contemporâneo.

Juliano Cazarré em cena do filme ‘Boi Neon’ | Imagem: Folha de São Paulo

No trabalho Nem o mandacaru e nem o chapéu de couro: análises das multiterritorialidades das identidades culturais sertanejas no semiárido de Sergipe (Conceição, 2021), o título evoca a geografia e a cultura específica do sertão sergipano. Destacando a identidade sertaneja, o título sugere uma análise rica em diversas categorias que se entrelaçam para abordar a complexidade do sertão brasileiro e suas representações. Ao adentrar as espacialidades, percebemos que o território físico e geográfico não é apenas um cenário passivo, mas sim um ator ativo na construção das identidades. A relação entre as pessoas e o espaço que habitam molda e é moldada por suas práticas culturais. As espacialidades tornam-se palcos onde as identidades se desdobram, evidenciando a interdependência entre as comunidades e os lugares que ocupam.

Numa visão geral, podemos afirmar que a diversidade e profundidade dos títulos fornecem uma base para uma análise aprofundada do sertão nordestino, abordando não apenas suas características geográficas, mas também suas complexidades culturais e sociais. Essa abordagem multifacetada é fundamental para uma compreensão abrangente dessa região única.

Discussão

Ao examinar as teses e dissertações nessa investigação, torna-se evidente que a maioria delas se concentra em questões relacionadas à identidade sertaneja, à cultura popular, especialmente à festa junina, e à literatura de cordel. Por um lado, a sua análise revela a diversidade de abordagens e lacunas na literatura acadêmica sobre as representações imagéticas do sertão e a identidade cultural sertaneja. Por outro, identifica alguns desafios na escrita acadêmica.

Os resultados da pesquisa fornecem percepções importantes sobre o sertão, como exemplificado na abordagem Configurando Espaços e Sujeitos: o Sertão e o Sertanejo nos Escritos de Ademar Vidal (1940–1950), que apresenta a construção de uma narrativa cultural sobre a espacialidade sertaneja. Para o autor, Vidal não se limita a retratar um sertão sofrido, mas destaca um sertão dos afetos, do amor ao local. Ele escreve para preservar suas melhores lembranças de vida e evitar que a modernidade interfira abruptamente no modo de vida dos sertanejos (Marques, 2022, p.12).

No caso da Festa de São João Batista da Rua do Capim em Goiás, o registro audiovisual emerge como uma ferramenta fundamental para preservar a memória coletiva e fortalecer a identidade cultural da comunidade. A devoção a São João Batista e as festividades associadas evidenciam como a fé, a coletividade e o pertencimento se entrelaçam, configurando o patrimônio do lugar (Sá, 2021, p.173). Dessa forma, o propósito desse estudo é destacar a relevância histórica da memória social da comunidade da Rua do Capim e da celebração em louvor a São João Batista. O texto quer promover a visibilidade desses elementos, contribuindo para uma compreensão mais ampla e apreciação da rica tradição cultural e religiosa enraizada nessa comunidade.

Ao explorar as territorialidades sobre a festa junina em Campina Grande (PB), a pesquisa já referida destaca como os festeiros demarcam, apropriam, percebem e vivenciam o território, gerando o que é denominado de territorialidades da festa junina (Marques, 2018, p.23). Isso sugere que a festa junina não apenas acontece em um local específico, mas é ativamente moldada e vivenciada pelos participantes, influenciando a construção da identidade local.

Em Rituais e folkcomunicação – um sistema de comunicação simbólico no São João do Maranhão (Almeida, 2018), a pesquisa revela que os rituais e a folkcomunicação desempenham um papel crucial na construção de sentido e na expressão da identidade maranhense. A análise dos sistemas de comunicação ritualística destaca a importância desses processos na formação e preservação da identidade cultural. A ritualidade, por isso, emerge como uma forma de comunicação capaz de expressar diversos conteúdos, destacando o papel central da identidade na cultura popular.

A utilização do cordel, como no texto Literatura de cordel e ensino de História: diálogos e possibilidades no Ensino Fundamental, se mostra promissora, evidenciando a proximidade entre a literatura de cordel e os discursos e culturas populares. A pesquisa indica que essa abordagem pode favorecer a interdisciplinaridade, a criatividade, o desenvolvimento de habilidades de leitura, a oralidade e o trabalho coletivo, enriquecendo o repertório dos estudantes (Costa, 2021, p.06). Nesse trabalho, os territórios explorados são reformulados, sobrepostos, dando a perceber a (re)configuração de sentidos e significados, especialmente das festividades juninas em diversas regiões. A pesquisa também destaca a relevância dos folhetos de cordel como fonte histórica para o ensino de História, proporcionando diálogo com livros didáticos e historiografia.

Os objetivos das pesquisas são claramente delineados, abrangendo análises de discursos, identidades, festividades, obras literárias e práticas sociais em diferentes regiões do Brasil. A interseção entre as áreas de literatura, cultura popular, história local e educação é evidente, proporcionando uma abordagem interdisciplinar. Além disso, o quadro teórico-metodológico é robusto, incluindo referências a diversos autores e conceitos como fenomenologia, identidade cultural, multiterritorialidade, poder simbólico, entre outros. Os objetivos específicos também são claramente delineados, abrangendo análises em diferentes regiões geográficas e temáticas.

No que tange às contribuições desses resultados para o desenvolvimento da nossa pesquisa, observamos que os estudos sobre a configuração de espaços e sujeitos no sertão, conforme expressos nos escritos de Ademar Vidal (1940–1950), com as análises acerca das multiterritorialidades das identidades culturais sertanejas no semiárido de Sergipe, sobre as territorialidades da festa junina em Campina Grande (PB), no contexto da literatura de cordel e seu papel no ensino de História, desempenham um papel significativo na fundamentação teórica da nossa pesquisa.

Estes estudos fornecem, sobretudo um arcabouço conceitual que pretendemos incorporar em nossa investigação. O emprego da hermenêutica filosófica de Gadamer é uma possibilidade, baseada no conceito de círculo hermenêutico, dividido em comensalidade, indumentária e espacialidade (Almeida, 2018). Outras contribuições vêm em forma de conceitos: Sertão (Arruda, 2000), Identidade Cultural (Hall, 1996; Bauman, 2005), multiterritorialidades (Haesbaer, 2004), Poder simbólico (Bourdieu,2010), Lugar em (Tuan, 2013), Cultura popular (Darnton, 1988; Burke, 2005; Certeau, 1982), Literatura (Cândido, 1999; Sevcenko, 1999), Ensino de História (Guimarães, 2003; Bittencourt, 2009) e Literatura de cordel (Lima, 2010; Marinho, 2012). Além disso, os citados estudos oferecem situações de uso das categorias História local (PCN, 1997) e Ensino de História (BNCC, 2018).

Do ponto de vista metodológico, as pesquisas adotam diversos procedimentos para obter uma compreensão abrangente dos temas investigados. Um exemplo notável é o emprego de instrumentos da História Oral, com ênfase na observação participante (Conceição, 2021), e a etnografia/etnografia digital (Marques, 2018). Diversos instrumentos de coleta e tratamento são destacados, incluindo entrevistas, diário de campo, diálogos abertos e registros fotográficos/videográficos, adaptando-se aos modos de construção do pensamento e aos objetivos específicos das pesquisas. O estudo de caso, por fim, possibilita o tratamento do material empírico obtido por meio de entrevista enquadrado em análise qualitativa. Ele contribui para a obtenção de uma visão mais detalhada e contextualizada dos fenômenos em estudo (Almeida, 2022).

Em resumo, os estudos apresentados contribuem para problematizar as categorias de sertão e sertanejo, bem como uma compreensão mais profunda das práticas culturais sertanejas, destacando as nuances nas abordagens de Vidal, as dinâmicas festivas, as formas de comunicação ritualística e o potencial educativo da literatura de cordel. Essas descobertas têm implicações significativas para a preservação da identidade cultural e para o enriquecimento do ensino de História, ao mesmo tempo que propõe a ampliação do nosso olhar sobre o sertão, oferecendo uma valiosa contribuição à nossa proposta de pesquisa.

A pesquisa também aponta que a utilização da história local como ferramenta pedagógica proporciona aos estudantes a oportunidade de se enxergarem como sujeitos históricos, contribuindo assim para a construção de parte de sua identidade cultural. No contexto da literatura de cordel, a análise revela que essa forma de expressão sempre esteve intrinsecamente ligada aos discursos e culturas populares. A sua incorporação no ensino de História mostra-se promissora, proporcionando benefícios como interdisciplinaridade, criatividade, desenvolvimento de habilidades de leitura, valorização da oralidade e estímulo ao trabalho coletivo.

Apesar das valiosas contribuições que encontramos neste levantamento, identificamos alguns aspectos ineficientes, os quais gostaríamos de não repetir em nossa investigação. Entre os mais prejudicais ao avanço do conhecimento das temáticas aqui discutidas estão: a ausência de detalhamento da metodologia, que inclua a seleção de fontes, métodos de análise e abordagens críticas, a ausência de extrapolações – hipóteses que permitam a generalização dos resultados para toda a região semiárida de Sergipe e a ausência de representação temporal, o que pode limitar a compreensão das transformações ao longo do tempo e subestimar a influência dessas mudanças.

Conclusões

Na introdução, delineamos nosso propósito de analisar a relevância dos elementos identitários da cultura popular, como a celebração junina e a literatura de cordel, no processo de consolidação da identidade sertaneja. Ao longo deste texto, buscamos apresentar argumentos que sustentem a tese de que a produção literária dedicada à sertanidade se distingue pela sua profunda exploração de temas ligados à cultura popular. Esses temas são predominantemente abordados a partir das representações do sertão, contribuindo para uma compreensão mais ampla e aprofundada da riqueza e complexidade dessa identidade singular.

Esta revisão desempenhou um papel fundamental ao direcionar nossas decisões acerca dos fundamentos teóricos e do escopo metodológico envolvidos na elaboração do nosso projeto de pesquisa. Estamos firmemente convencidos de que as melhores abordagens para explorar nossa pergunta central — “Quais elementos inerentes aos festejos juninos podem ser utilizados como ferramentas para o ensino de História, com o objetivo de fortalecer o sentimento de pertencimento dos estudantes ao sertão baiano, e como a literatura de cordel pode potencializar essa abordagem em sala de aula?” – envolvem o alinhamento com as representações do sertão no contexto da cultura popular e da identidade sertaneja.

Após esta jornada, é com entusiasmo que apresentamos os alicerces do nosso projeto de pesquisa. Este consistirá em uma dissertação que se propõe a abordar a Festa de São João, a sertanidade e o cordel no ensino de história, considerando-os como elementos identitários fundamentais para instigar o sentimento de pertencimento ao sertão euclidense. Nossa missão é compreender e valorizar as tradições culturais dessa região, explorando a riqueza da festa de São João e a poesia popular do cordel como componentes essenciais na formação da identidade local. A escolha desse tema se justifica pela percepção da ausência de um sentimento de pertencimento e identificação dos estudantes à identidade sertaneja, inferindo os festejos juninos como um dos elementos identitários de afirmação da sertanidade, que pode ser potencializado no ensino de história através da literária do cordel.

Fontes

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ARAUJO, Natalia Raiane de Paiva. Os Sertões Naturais sobre as lentes de Oswaldo Lamartine de Faria (1940-1980). Caicó, 2022. 105 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Rio Grande Do Norte.

AZEVEDO, Gleice Linhares de. O sertão é neon: transversalidades e pluralidades de identidades de gêneros no filme boi neon de Gabriel Mascaro. Caicó, 2022. 156 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal Do Rio Grande do Norte.

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MARQUES, Jordania Alyne Santos. As territorialidades da festa junina de Campina Grande (PB) (2016-2017). Natal, 2018. 116 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

MARQUES, Maria Joedna Rodrigues. Configurando Espaços e Sujeitos: o sertão e o sertanejo nos escritos de Ademar Vidal (1940-1950). Caicó, 2022. 109 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

MEDEIROS, Franciely de Lucena. Captura dos sertões na rede: um olhar sobre os sertões contemporâneos divulgados/visualizados nas mídias digitais (2018- 2020). Caicó, 2022. 101 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

MEDEIROS, Maria Alda Jana Dantas de. Vastas e ermas: mulheres não brancas no sertão do Rio Grande (Seridó, séculos XVIII E XIX). Caicó, 2022. 277 F. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal Do Rio Grande do Norte, Caicó, 2022.

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SA, Sinara Carvalho de. Festa de São João Batista da Rua do Capim (Goiás, Go): registro audiovisual como possibilidade de fortalecimento da memória e da identidade no lugar. Goiânia, 2021. 191 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Estudos Culturais Memoria e Patrimônio) – Universidade Estadual de Goiás.

Referências

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DARNTON, R. O grande massacre de gatos: e outros episódios da história cultural francesa. 2ed. Rio de Janeiro: Graal, 1988.

FREITAS, Itamar. Orientações para a escrita de um artigo simplificado de revisão da literatura com o auxílio de Inteligência Artificial. Resenha Crítica. Aracaju/Crato, 12 maio, 2023. Disponível em <https://www.resenhacritica.com.br/a-cursos/orientacoes-para-a-escrita-de-um-artigo-simplificado-de-revisao-da-literatura-com-o-auxiiio-da-inteligenci-artificial/>.

HALL, Stuart. Identidade cultural e diáspora. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Rio de Janeiro, v.x, n.x, p. 68-75, 1996.

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TUAN, Yu‐Fu. Espaço e lugar. A perspectiva da experiência. Londrina: EDUEL, 2013.

Para ampliar a sua revisão da literatura


Autora

Sandra Maria dos Santos é mestranda em História (ProfHistória/UFS), Bolsista da CAPES, especialista em História Afro-brasileira (FIJ), licenciada em História (CESVASF) e professora do ensino básico (SEC/Euclides da Cunha-BA). ID LATTES: http://lattes.cnpq.br/4646320281558583; ID ORCID: https://orcid.org/0009-0007-4961-0482; E-mail: [email protected].

 

 


Para citar este texto

SANTOS, Sandra Maria. Sertanidade e aprendizagem histórica – Revisão da literatura. Crítica Historiográfica. Natal, v.3, n.13, set./out., 2023. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/sertanidade-e-aprendizagem-historica-revisao-da-literatura-sandra-maria-dos-santos-sec-euclides-da-cunha-ba/>.


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA).

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.3, n. 13, set./out., 2023 | ISSN 2764-2666

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Sertanidade e aprendizagem histórica – Revisão da literatura | Sandra Maria dos Santos (SEC/Euclides da Cunha-BA)

Apresentação de Quadrilha em Euclides da Cunha [2021] | Imagem: Prefeitura Municipal de Euclides da Cunha
Resumo: Este artigo de revisão analisa a cultura popular sertaneja, focando em festas juninas e literatura de cordel no Nordeste brasileiro (2018–2022). Utiliza uma abordagem interdisciplinar para explorar a identidade cultural, espaço e territorialidades do sertão, sugerindo pesquisas futuras para compreender melhor esses elementos na educação histórica.

Palavras-chave: Sertão, Sertanidade, Festa Junina, Literatura de Cordel.


Introdução

No presente artigo, revisamos a literatura especializada sobre elementos identitários da cultura popular presentes no sertão nordestino que contribuem no processo de afirmação da identidade sertaneja. Dentre esses elementos, destacamos a cultura junina e a literatura de cordel, buscando subsídios para refinar um projeto de pesquisa que elucide as seguintes indagações: Quais elementos dos festejos juninos podem ser empregados como ferramentas para o ensino de história, com o intuito de reafirmar o sentimento de pertencimento de estudantes ao sertão baiano? Como a literatura de cordel pode potencializar essa abordagem em sala de aula? Este estudo integra uma pesquisa de mestrado intitulada A festa de São João, a sertanidade e o cordel no ensino de História como elementos identitários de pertencimento ao sertão euclidense, desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-graduação do Mestrado Profissional em Ensino de História (ProfHistória), na Universidade Federal de Sergipe — UFS/SE, durante o biênio 2023–2024.

O levantamento foi empreendido entre agosto e outubro de 2023, com base nos trabalhos registrados no banco de dados do Catálogo de Teses e Dissertações da Fundação CAPES, produzidos entre 2018 e 2022, nas áreas das ciências humanas, com ênfase em ensino de História. A escolha desses trabalhos foi orientada pela presença dos seguintes descritores: “sertão”, “sertanidade”, “identidade sertaneja”, “cultura popular”, “festa junina”, “festa de São João”, “identidade cultural” e “literatura de cordel”.

Resultados

No decorrer da pesquisa identificamos 159 trabalhos que abordam questões pertinentes a cultura e a identidade sertaneja. Aproximadamente 135 (85%) dessas pesquisas foram divulgadas na forma de dissertações, enquanto os 24 (15%) restantes se apresentaram sob a forma de teses de doutorado. Vale destacar que esses números não englobam a totalidade que priorizamos para a análise de títulos. Enfatizamos que apenas 1/5 desse material abrange dois ou mais descritores e está mais alinhado ao nosso tema de pesquisa, que envolve questões relacionadas à identidade sertaneja, à cultura junina e à literatura de cordel. Por essa razão, optamos por selecionar apenas 12 textos para uma leitura integral.

A distribuição percentual desse levantamento reflete uma ênfase significativa na cultura popular, constituindo 43% do total. Esse segmento, contempla entre outros elementos as festas juninas e literatura de cordel, que são como peças centrais da nossa investigação no mestrado. Além disso, há uma atenção considerável dedicada às representações do sertão, abrangendo 14% do escopo da pesquisa. As categorias de identidades e relações étnico-raciais compartilham uma porcentagem semelhante, cada uma com 10%, indicando uma abordagem equilibrada na análise de diferentes identidades culturais e suas implicações.

O ensino de história é abordado em 9% dos textos, sugerindo uma preocupação em compreender como esses temas são incorporados no ambiente educacional. A educação, com 6%, e políticas públicas, com 4%, ampliam a perspectiva para considerações mais amplas sobre o impacto social e governamental desses elementos culturais. Apenas 1% dos títulos não estão diretamente alinhados às propostas de pesquisa, destacando uma coesão geral no escopo do estudo. Essa distribuição sugere uma abordagem abrangente e equilibrada, integrando diversos aspectos para uma compreensão mais completa do fenômeno cultural examinado.

Ao analisar os títulos pesquisados, percebe-se uma diversidade de temas abordando o sertão, que vão desde questões culturais e literárias até aspectos políticos e sociais. Os títulos evidenciam uma variedade temática, cobrindo não apenas a geografia física do sertão, mas também suas complexidades culturais, históricas e sociais. Isso reflete uma abordagem abrangente para compreender a região. A presença de títulos que abordam temas literários, históricos, antropológicos e sociológicos destaca a interdisciplinaridade na análise do sertão. Isso é positivo, pois permite uma compreensão mais profunda e rica da região. Muitos títulos exploram a identidade cultural e a relação entre as pessoas e o território sertanejo. Essa ênfase pode proporcionar uma compreensão significativa sobre como as comunidades locais percebem e constroem sua própria identidade.

Títulos como Os Sertões Naturais sobre as Lentes de Oswaldo Lamartine de Faria (1940–1980) (Araujo, 2022) sugerem uma abordagem visual, trazendo uma dimensão estética para a compreensão do sertão, isso é proveitoso para uma apreciação mais holística da região. Alguns títulos focam em vozes e perspectivas marginalizadas, como Vastas e Ermas: Mulheres Não Brancas no Sertão do Rio Grande (Seridó, séculos XVIII E XIX), (Santos, 2022), iniciativas fundamentais para uma representação mais justa e inclusiva da diversidade existente no sertão. Títulos como Captura dos sertões na rede: um olhar sobre os sertões contemporâneos divulgados/visualizados nas mídias digitais (2018–2020), (Medeiros, 2022), indicam uma atenção à contemporaneidade, explorando como o sertão é representado e percebido na era digital, adicionando uma dimensão moderna e relevante à pesquisa.

A presença de títulos que abordam programas governamentais, movimentos sociais e questões de classe revela uma consideração pelas dinâmicas políticas e sociais que moldam a vida no sertão. A inclusão de títulos que exploram a cultura popular como em SÁ (2021), Festa de São João Batista da Rua do Capim (Goiás, Go): registro audiovisual como possibilidade de fortalecimento da memória e da identidade no lugar, bem como títulos que abordam a literatura de cordel e a voz indígena ressaltam a importância de considerar diversas perspectivas na compreensão do sertão.

Ao mergulharmos nesse contexto, somos levados a explorar as intricadas relações entre identidades culturais, espacialidades e territorialidades, desvendando assim o sertão como um território simbólico onde as nuances da cultura se manifestam de maneira singular. A cultura popular se revela, assim, como uma arena vibrante onde identidades individuais e coletivas ganham forma e substância.

O título, O sertão é neon: transversalidades e pluralidades de identidades de gêneros no filme boi neon de Gabriel Mascaro (Azevedo, 2022) proporciona uma análise rica e contextualizada do sertão e suas representações. A análise do filme “Boi Neon” oferece uma oportunidade para discutir como a cultura popular e a identidade sertaneja são representadas no cinema contemporâneo.

Juliano Cazarré em cena do filme ‘Boi Neon’ | Imagem: Folha de São Paulo

No trabalho Nem o mandacaru e nem o chapéu de couro: análises das multiterritorialidades das identidades culturais sertanejas no semiárido de Sergipe (Conceição, 2021), o título evoca a geografia e a cultura específica do sertão sergipano. Destacando a identidade sertaneja, o título sugere uma análise rica em diversas categorias que se entrelaçam para abordar a complexidade do sertão brasileiro e suas representações. Ao adentrar as espacialidades, percebemos que o território físico e geográfico não é apenas um cenário passivo, mas sim um ator ativo na construção das identidades. A relação entre as pessoas e o espaço que habitam molda e é moldada por suas práticas culturais. As espacialidades tornam-se palcos onde as identidades se desdobram, evidenciando a interdependência entre as comunidades e os lugares que ocupam.

Numa visão geral, podemos afirmar que a diversidade e profundidade dos títulos fornecem uma base para uma análise aprofundada do sertão nordestino, abordando não apenas suas características geográficas, mas também suas complexidades culturais e sociais. Essa abordagem multifacetada é fundamental para uma compreensão abrangente dessa região única.

Discussão

Ao examinar as teses e dissertações nessa investigação, torna-se evidente que a maioria delas se concentra em questões relacionadas à identidade sertaneja, à cultura popular, especialmente à festa junina, e à literatura de cordel. Por um lado, a sua análise revela a diversidade de abordagens e lacunas na literatura acadêmica sobre as representações imagéticas do sertão e a identidade cultural sertaneja. Por outro, identifica alguns desafios na escrita acadêmica.

Os resultados da pesquisa fornecem percepções importantes sobre o sertão, como exemplificado na abordagem Configurando Espaços e Sujeitos: o Sertão e o Sertanejo nos Escritos de Ademar Vidal (1940–1950), que apresenta a construção de uma narrativa cultural sobre a espacialidade sertaneja. Para o autor, Vidal não se limita a retratar um sertão sofrido, mas destaca um sertão dos afetos, do amor ao local. Ele escreve para preservar suas melhores lembranças de vida e evitar que a modernidade interfira abruptamente no modo de vida dos sertanejos (Marques, 2022, p.12).

No caso da Festa de São João Batista da Rua do Capim em Goiás, o registro audiovisual emerge como uma ferramenta fundamental para preservar a memória coletiva e fortalecer a identidade cultural da comunidade. A devoção a São João Batista e as festividades associadas evidenciam como a fé, a coletividade e o pertencimento se entrelaçam, configurando o patrimônio do lugar (Sá, 2021, p.173). Dessa forma, o propósito desse estudo é destacar a relevância histórica da memória social da comunidade da Rua do Capim e da celebração em louvor a São João Batista. O texto quer promover a visibilidade desses elementos, contribuindo para uma compreensão mais ampla e apreciação da rica tradição cultural e religiosa enraizada nessa comunidade.

Ao explorar as territorialidades sobre a festa junina em Campina Grande (PB), a pesquisa já referida destaca como os festeiros demarcam, apropriam, percebem e vivenciam o território, gerando o que é denominado de territorialidades da festa junina (Marques, 2018, p.23). Isso sugere que a festa junina não apenas acontece em um local específico, mas é ativamente moldada e vivenciada pelos participantes, influenciando a construção da identidade local.

Em Rituais e folkcomunicação – um sistema de comunicação simbólico no São João do Maranhão (Almeida, 2018), a pesquisa revela que os rituais e a folkcomunicação desempenham um papel crucial na construção de sentido e na expressão da identidade maranhense. A análise dos sistemas de comunicação ritualística destaca a importância desses processos na formação e preservação da identidade cultural. A ritualidade, por isso, emerge como uma forma de comunicação capaz de expressar diversos conteúdos, destacando o papel central da identidade na cultura popular.

A utilização do cordel, como no texto Literatura de cordel e ensino de História: diálogos e possibilidades no Ensino Fundamental, se mostra promissora, evidenciando a proximidade entre a literatura de cordel e os discursos e culturas populares. A pesquisa indica que essa abordagem pode favorecer a interdisciplinaridade, a criatividade, o desenvolvimento de habilidades de leitura, a oralidade e o trabalho coletivo, enriquecendo o repertório dos estudantes (Costa, 2021, p.06). Nesse trabalho, os territórios explorados são reformulados, sobrepostos, dando a perceber a (re)configuração de sentidos e significados, especialmente das festividades juninas em diversas regiões. A pesquisa também destaca a relevância dos folhetos de cordel como fonte histórica para o ensino de História, proporcionando diálogo com livros didáticos e historiografia.

Os objetivos das pesquisas são claramente delineados, abrangendo análises de discursos, identidades, festividades, obras literárias e práticas sociais em diferentes regiões do Brasil. A interseção entre as áreas de literatura, cultura popular, história local e educação é evidente, proporcionando uma abordagem interdisciplinar. Além disso, o quadro teórico-metodológico é robusto, incluindo referências a diversos autores e conceitos como fenomenologia, identidade cultural, multiterritorialidade, poder simbólico, entre outros. Os objetivos específicos também são claramente delineados, abrangendo análises em diferentes regiões geográficas e temáticas.

No que tange às contribuições desses resultados para o desenvolvimento da nossa pesquisa, observamos que os estudos sobre a configuração de espaços e sujeitos no sertão, conforme expressos nos escritos de Ademar Vidal (1940–1950), com as análises acerca das multiterritorialidades das identidades culturais sertanejas no semiárido de Sergipe, sobre as territorialidades da festa junina em Campina Grande (PB), no contexto da literatura de cordel e seu papel no ensino de História, desempenham um papel significativo na fundamentação teórica da nossa pesquisa.

Estes estudos fornecem, sobretudo um arcabouço conceitual que pretendemos incorporar em nossa investigação. O emprego da hermenêutica filosófica de Gadamer é uma possibilidade, baseada no conceito de círculo hermenêutico, dividido em comensalidade, indumentária e espacialidade (Almeida, 2018). Outras contribuições vêm em forma de conceitos: Sertão (Arruda, 2000), Identidade Cultural (Hall, 1996; Bauman, 2005), multiterritorialidades (Haesbaer, 2004), Poder simbólico (Bourdieu,2010), Lugar em (Tuan, 2013), Cultura popular (Darnton, 1988; Burke, 2005; Certeau, 1982), Literatura (Cândido, 1999; Sevcenko, 1999), Ensino de História (Guimarães, 2003; Bittencourt, 2009) e Literatura de cordel (Lima, 2010; Marinho, 2012). Além disso, os citados estudos oferecem situações de uso das categorias História local (PCN, 1997) e Ensino de História (BNCC, 2018).

Do ponto de vista metodológico, as pesquisas adotam diversos procedimentos para obter uma compreensão abrangente dos temas investigados. Um exemplo notável é o emprego de instrumentos da História Oral, com ênfase na observação participante (Conceição, 2021), e a etnografia/etnografia digital (Marques, 2018). Diversos instrumentos de coleta e tratamento são destacados, incluindo entrevistas, diário de campo, diálogos abertos e registros fotográficos/videográficos, adaptando-se aos modos de construção do pensamento e aos objetivos específicos das pesquisas. O estudo de caso, por fim, possibilita o tratamento do material empírico obtido por meio de entrevista enquadrado em análise qualitativa. Ele contribui para a obtenção de uma visão mais detalhada e contextualizada dos fenômenos em estudo (Almeida, 2022).

Em resumo, os estudos apresentados contribuem para problematizar as categorias de sertão e sertanejo, bem como uma compreensão mais profunda das práticas culturais sertanejas, destacando as nuances nas abordagens de Vidal, as dinâmicas festivas, as formas de comunicação ritualística e o potencial educativo da literatura de cordel. Essas descobertas têm implicações significativas para a preservação da identidade cultural e para o enriquecimento do ensino de História, ao mesmo tempo que propõe a ampliação do nosso olhar sobre o sertão, oferecendo uma valiosa contribuição à nossa proposta de pesquisa.

A pesquisa também aponta que a utilização da história local como ferramenta pedagógica proporciona aos estudantes a oportunidade de se enxergarem como sujeitos históricos, contribuindo assim para a construção de parte de sua identidade cultural. No contexto da literatura de cordel, a análise revela que essa forma de expressão sempre esteve intrinsecamente ligada aos discursos e culturas populares. A sua incorporação no ensino de História mostra-se promissora, proporcionando benefícios como interdisciplinaridade, criatividade, desenvolvimento de habilidades de leitura, valorização da oralidade e estímulo ao trabalho coletivo.

Apesar das valiosas contribuições que encontramos neste levantamento, identificamos alguns aspectos ineficientes, os quais gostaríamos de não repetir em nossa investigação. Entre os mais prejudicais ao avanço do conhecimento das temáticas aqui discutidas estão: a ausência de detalhamento da metodologia, que inclua a seleção de fontes, métodos de análise e abordagens críticas, a ausência de extrapolações – hipóteses que permitam a generalização dos resultados para toda a região semiárida de Sergipe e a ausência de representação temporal, o que pode limitar a compreensão das transformações ao longo do tempo e subestimar a influência dessas mudanças.

Conclusões

Na introdução, delineamos nosso propósito de analisar a relevância dos elementos identitários da cultura popular, como a celebração junina e a literatura de cordel, no processo de consolidação da identidade sertaneja. Ao longo deste texto, buscamos apresentar argumentos que sustentem a tese de que a produção literária dedicada à sertanidade se distingue pela sua profunda exploração de temas ligados à cultura popular. Esses temas são predominantemente abordados a partir das representações do sertão, contribuindo para uma compreensão mais ampla e aprofundada da riqueza e complexidade dessa identidade singular.

Esta revisão desempenhou um papel fundamental ao direcionar nossas decisões acerca dos fundamentos teóricos e do escopo metodológico envolvidos na elaboração do nosso projeto de pesquisa. Estamos firmemente convencidos de que as melhores abordagens para explorar nossa pergunta central — “Quais elementos inerentes aos festejos juninos podem ser utilizados como ferramentas para o ensino de História, com o objetivo de fortalecer o sentimento de pertencimento dos estudantes ao sertão baiano, e como a literatura de cordel pode potencializar essa abordagem em sala de aula?” – envolvem o alinhamento com as representações do sertão no contexto da cultura popular e da identidade sertaneja.

Após esta jornada, é com entusiasmo que apresentamos os alicerces do nosso projeto de pesquisa. Este consistirá em uma dissertação que se propõe a abordar a Festa de São João, a sertanidade e o cordel no ensino de história, considerando-os como elementos identitários fundamentais para instigar o sentimento de pertencimento ao sertão euclidense. Nossa missão é compreender e valorizar as tradições culturais dessa região, explorando a riqueza da festa de São João e a poesia popular do cordel como componentes essenciais na formação da identidade local. A escolha desse tema se justifica pela percepção da ausência de um sentimento de pertencimento e identificação dos estudantes à identidade sertaneja, inferindo os festejos juninos como um dos elementos identitários de afirmação da sertanidade, que pode ser potencializado no ensino de história através da literária do cordel.

Fontes

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MARQUES, Jordania Alyne Santos. As territorialidades da festa junina de Campina Grande (PB) (2016-2017). Natal, 2018. 116 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

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MEDEIROS, Maria Alda Jana Dantas de. Vastas e ermas: mulheres não brancas no sertão do Rio Grande (Seridó, séculos XVIII E XIX). Caicó, 2022. 277 F. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal Do Rio Grande do Norte, Caicó, 2022.

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Referências

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Autora

Sandra Maria dos Santos é mestranda em História (ProfHistória/UFS), Bolsista da CAPES, especialista em História Afro-brasileira (FIJ), licenciada em História (CESVASF) e professora do ensino básico (SEC/Euclides da Cunha-BA). ID LATTES: http://lattes.cnpq.br/4646320281558583; ID ORCID: https://orcid.org/0009-0007-4961-0482; E-mail: [email protected].

 

 


Para citar este texto

SANTOS, Sandra Maria. Sertanidade e aprendizagem histórica – Revisão da literatura. Crítica Historiográfica. Natal, v.3, n.13, set./out., 2023. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/sertanidade-e-aprendizagem-historica-revisao-da-literatura-sandra-maria-dos-santos-sec-euclides-da-cunha-ba/>.


© – Os autores que publicam em Crítica Historiográfica concordam com a distribuição, remixagem, adaptação e criação a partir dos seus textos, mesmo para fins comerciais, desde que lhe sejam garantidos os devidos créditos pelas criações originais. (CC BY-SA).

 

Crítica Historiográfica. Natal, v.3, n. 13, set./out., 2023 | ISSN 2764-2666

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